quarta-feira, 3 de julho de 2024

Cláudio Manuel da Costa e a procura do ouro nas Gerais

Cláudio Manuel da Costa foi um dos integrantes mais notáveis da Inconfidência Mineira. Nascido em Minas Gerais em 1729, foi ao Reino, estudou em Coimbra e voltou ao Brasil, para viver e atuar como advogado e escritor em Vila Rica. 
A capital das Minas Gerais nesse tempo era não apenas um centro urbano importante, mas, para os padrões da época, um polo cultural significativo. Ali se lia muito, se estudava, se discutia. A riqueza proporcionada pelo ouro permitiu que a arquitetura sacra se desenvolvesse e, apesar de guiada pela estética barroca, ostentasse, também, algumas características nacionais. Não é surpreendente, portanto, que também questões políticas fossem ventiladas. Mesmo proibidas, as obras de autores iluministas acabavam chegando a quem sabia o francês e, de mão em mão, circulavam e iam encontrar abrigo junto às cabeças pensantes da Capitania. 
Como sempre, é preciso escrever um "porém": porém a produção aurífera entrava já em declínio, ainda que a Corte, distante, não se desse conta disso e esperasse receber os mesmos quintos de sempre. Mas era impossível, e temia-se a "derrama", cobrança forçada dos impostos atrasados. A partir daí, fermentou a revolta, que não passou de palavras e projetos. Delatores correram ao governador, visconde de Barbacena, e deram com a língua nos dentes. Desses, o mais famoso é, de longe, Joaquim Silvério dos Reis, mas é certo que não foi o único. O governador agiu rápido, os supostos conjurados foram presos. Entre eles, estava Cláudio Manuel da Costa. Alegou-se que, em 4 de julho de 1789, cometeu suicídio na prisão, mas desde sempre houve questionamentos. Talvez tenha sido assassinado, e parece que havia mesmo quem tivesse motivos para tanto. É por isso que, ao contrário de outros inconfidentes de 1789, não foi levado ao Rio de Janeiro para o processo conhecido como Devassa. De um modo ou de outro, morreu antes.
Entre as obras de Cláudio Manuel da Costa está o poema Vila Rica, escrito em 1773 sob o pseudônimo de Glauceste Satúrnio, conforme era costume na época. Nestes versos, o autor descreve a busca por ouro no Brasil Colonial, salientando a pouca experiência em mineração dos homens que escavavam o solo:

"A continuar a marcha se dispunha
O herói, que um vivo zelo testemunha
Em todos os que o seguem; repartidos
Aqueles a quem são mais conhecidos
Os sertões pela margem se espalhavam
À direita do rio e se empregavam
Em socavar a terra, em diligência
Do metal, de que têm verde experiência." 

Em outro trecho, o poeta retrata o trabalho dos escravos na extração do ouro:

"Passa este quadro, e logo outra pintura
Nova imagem propõem, nova figura,
Que retrata uns mortais de negras cores,
Regando o aflito solo de suores
À força das fadigas, com que cavam
As brutas serras, e nos rios lavam
As porções extraídas, separando
As pedras do metal, que andam buscando."

Era essa, em poesia, a realidade das minas, que Cláudio Manuel da Costa presenciava, a todo instante em Vila Rica, a que hoje chamamos Ouro Preto.  


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segunda-feira, 1 de julho de 2024

Tempo para os deveres religiosos dos missionários que iam ao sertão

Relógios de pulso são coisa relativamente recente na história da humanidade. Mesmo relógios com ponteiros para minutos não contam mais que alguns séculos. Por muito tempo, já era moderno o bastante, na torre de uma igreja ou na sede da administração municipal, ter um relógio capaz de marcar as horas. Afinal, a urgência na contagem do tempo é coisa que caminha ao lado do desenvolvimento tecnológico e, por consequência, da aceleração no ritmo das atividades humanas.
No Brasil, missionários jesuítas adaptavam sua rotina às necessidades da catequese de indígenas, embora os que viviam nos colégios conservassem a rotina prevista na regra da Ordem. Precisavam, contudo, ter algum tipo de relógio quando, indo ao sertão em suas missões, ainda assim cumpriam seus deveres religiosos. Por informação do padre André de Barros, sabemos qual o procedimento adotado pelo também jesuíta padre Antônio Vieira (¹), nas ocasiões em que ele e outros missionários estavam longe dos respectivos colégios:
"Ainda nas missões, ou caminhando, ou navegando só com os índios, aos tempos determinados para a oração e exames, tocava ele [Antônio Vieira] a campainha, que sempre levava, e relógio de areia para medir o tempo; e como se estivesse nos colégios, observava a obediência e regularidade deles." (²)
Um relógio de areia não seria muito útil para nós, hoje, a não ser como decoração. Mas bastava para os padrões do Século XVII, e dificilmente deixaria de funcionar, daí porque ainda era o preferido de muita gente.  

(1) 1608 - 1697. 
(2) BARROS, André de, S. J. Vida do Apostólico Padre Antônio Vieira. Lisboa: Officina Sylviana, 1746, p. 592.


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