quinta-feira, 28 de julho de 2022

Como Pirro conseguiu os elefantes usados na guerra contra Roma

Foi na Batalha de Heracleia, em 280 a.C., que Pirro, rei do Épiro, lutando para socorrer a cidade de Tarento, apresentou aos romanos uma grande novidade: elefantes. Cavalos eram usados em combate há muito tempo - mas, elefantes?... Os romanos, que nunca haviam visto ditos animais, ficaram apavorados, considerando que não fossem seres vivos. Só mais tarde é que acabaram descobrindo que, mesmo longevos, elefantes também morriam
Mas, afinal, onde foi que Pirro conseguiu os elefantes que conduziu à batalha? De acordo com Pausânias, autor do Século II, foi Alexandre Magno o primeiro líder militar europeu a ter elefantes à disposição para a guerra: 
Alexandre Magno (³)
"O primeiro na Europa a ter elefantes foi Alexandre [...], e depois de sua morte, outros reis os tiveram, principalmente Antígono. Pirro, ao lutar contra Demétrio (¹), conquistou os animais que tinha. Provocaram muito medo na guerra contra os romanos, que não podiam crer que fossem animais. Antes que macedônios atravessassem a Ásia, o uso do marfim nas artes e no mobiliário já era conhecido, mas ninguém sabia como eram os animais de onde provinha, com exceção dos indianos, dos líbios e de povos vizinhos a eles."
(²)
Para simplificar: Alexandre morreu muito jovem, e os generais que estavam sob seu comando travaram uma luta feroz pelo poder, disputando, inclusive, quem ficaria com a respeitável coleção de elefantes. Alguns deles acabaram em poder de Pirro, que levou-os ao combate contra Roma. 
Mais tarde, os próprios romanos tentaram empregar elefantes nas guerras que faziam, mas perceberam que sua utilidade era duvidosa. Ao contrário dos cavalos, que podiam ser auxiliares formidáveis em batalha, os elefantes, pesadões, quando irritados acabavam esmagando não só inimigos, como também aliados. Não eram, pois, o tipo de "arma" que mais se poderia desejar. Acabaram relegados aos espetáculos nos anfiteatros, onde, por algum tempo, fizeram bastante sucesso.

(1) Cerca de 287 a.C., no contexto das guerras pela sucessão de Alexandre.
(2) PAUSÂNIAS. Descrição da Grécia, Livro I. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias
(3) Cf. HEKLER, Anton. Die Bildniskunst der Griechen und Römer. Stuttgart: Julius Hoffmann, 1912, p. 61. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog. 


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quinta-feira, 21 de julho de 2022

As conquistas militares, o desenvolvimento do comércio e a vaidade das damas romanas

As conquistas militares de Roma abriram as portas para o comércio em larga escala. A produção dos mais variados lugares afluía à capital do Império. Embarcações que cruzavam o Mediterrâneo se encarregavam de trazer enorme variedade de mercadorias, sem desconsiderar o transporte terrestre, também muito praticado. Mesmo regiões que estavam fora do alcance das armas de Roma acabavam, de algum modo, se relacionando com o Império através do comércio. Floro (¹), um contemporâneo do imperador Adriano, escreveu, no livro IV de Epitome rerum Romanarum, que indianos, em uma viagem até Roma, teriam levado quatro anos. Sua chegada provocou certo alvoroço, pelo interesse no que traziam: pérolas e elefantes (²).
Dama romana não identificada (³)
Em Roma, os tecidos finos, especialmente as sedas do Oriente, eram muito apreciados. Mulheres romanas amavam tecidos coloridos, porque era desse modo que seus trajes se diferenciavam daqueles usados pelos homens. É evidente, também, que tecidos de qualidade eram um fator que dispensava as palavras para esclarecer quem eram as grandes damas da elite econômica. O mundo não mudou tanto assim desde então. Além disso
, mulheres romanas de alta posição social usavam muitas joias, se comparadas à média das mulheres ocidentais na atualidade, mesmo se levarmos em conta apenas o padrão para ocasiões especiais.
De onde vinha tanta riqueza? As conquistas militares explicam parte desse fenômeno, porque foram decisivas para abrir, até pela força, em certos casos, rotas comerciais que possibilitavam o afluxo de artigos de luxo para a grande capital da época. Acrescente-se que era a capacidade militar de Roma que assegurava, em última análise, a paz que permitia a prática do comércio, e ter-se-á um quadro, simplificado, é fato, mas suficiente para o entendimento da relação existente entre as grandes conquistas militares, o desenvolvimento e manutenção de rotas de comércio e a vaidade das damas romanas (⁴). São capazes, leitores, de estabelecer alguma analogia com a atualidade? 

(1) Aneu Floro viveu entre os Séculos I e II.
(2) Cf. FLORO, Aneu. Epitome rerum Romanarum, Livro IV.
(3) Cf. HEKLER, Anton. Die Bildniskunst der Griechen und Römer. Stuttgart: Julius Hoffmann, 1912, p. 237. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog. 
(3) Principalmente nos Séculos I e II, sem exclusão de outras épocas. 


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quinta-feira, 14 de julho de 2022

Vacinação pública contra a varíola em São Paulo em 1816

A varíola foi um dos grandes terrores no Brasil Colonial. Temida, por suposto, pela população de origem europeia, era muito pior quando atingia indígenas, entre os quais o número de óbitos se mostrava elevadíssimo. No final do Século XVIII, por instrução do príncipe D. João, o futuro D. João VI, a vacinação antivariólica foi introduzida no Brasil, e, embora sempre houvesse quem, por medo, ignorância ou descuido, deixasse de se fazer vacinar, já não era preciso viver sob o medo constante da morte e, tão terrível quanto, sob a ameaça de deformação vitalícia pela varíola, como acontecera nos séculos precedentes. 
Em um documento interessante, registro de vereança da Câmara de São Paulo de 21 de agosto de 1816, pode-se ler: "[...] fazer público ao povo em como o Senhor Conde de Palma manda de amanhã em diante manda o dito senhor vacinar na sala do governo a quem quiser se vacinar [...]". Entenda-se que "vacina", nesse tempo, era sinônimo de vacinação contra a varíola.
Embora a Ata da Câmara de São Paulo não trouxesse, posteriormente, qualquer informação quanto ao grau de adesão à vacina, podemos extrair, sem receio de erro, ao menos três conclusões:
  • A vacina contra a varíola era já suficientemente conhecida, a ponto de não ser necessário, sobre ela, dar maiores explicações à população;
  • A vacinação pública destinava-se a qualquer pessoa que desejasse ser imunizada;
  • Finalmente, era o poder público, na pessoa do Conde de Palma, quem tomava tão útil iniciativa, que devia cumprir-se "na sala do governo". 
Inegável progresso, esse, em se tratando de saúde pública. A lamentar, apenas, fica o fato de que demorou um tempo considerável para que a vacinação contra a varíola se tornasse geral, e mesmo obrigatória, ainda que sob certa oposição. 


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quinta-feira, 7 de julho de 2022

Tática de terra arrasada na luta pelo Nordeste açucareiro

Em uma guerra, destruir tudo o que pode ser útil ao inimigo é, quase sempre, uma atitude desesperada, tática extrema quando nada mais parece funcionar.
Foi no ano de 1635, após a Paraíba ter passado ao controle dos holandeses, a quem a resistência luso-brasileira tentava expulsar do Brasil, desde que haviam ocupado parte de Pernambuco em 1630. Percebendo que o desânimo tomava conta dos seus já pouco numerosos subordinados, o general Matias de Albuquerque decidiu que, se não fosse possível vencer, nada seria deixado à Companhia das Índias Ocidentais. Principalmente, não haveria pilhagem do cobiçado açúcar do Nordeste, razão maior da invasão a Pernambuco. Ao dar ordens a um de seus comandados, recomendou que "quando não fosse possível lutar, [...], que se queimassem todos os canaviais de açúcar e todo o pau-brasil, e se desfizessem todas as plantações, para que o inimigo de nada se aproveitasse [...]" (¹).
A desproporção entre as forças beligerantes era acentuada. Os reforços vindos da Europa para os holandeses eram muito superiores àqueles que a Coroa espanhola (²), com reduzido empenho, enviava ao Brasil. Não se podia esperar que senhores de engenho, lavradores de cana, indígenas e escravos sem qualquer treinamento militar formal, se comportassem como hábeis soldados. Assim, pouco a pouco, mesmo alguns que apoiavam a resistência começaram a abandonar a luta, julgando que, afinal, se fosse possível produzir açúcar e lucrar com isso, não importava muito se os senhores da terra seriam os portugueses ou os holandeses. Com oscilações de intensidade, a guerra ainda iria durar quase duas décadas.

(1) COELHO, Duarte de Albuquerque. Memorias Diarias de la Guerra del Brasil. Madrid: Diego Diaz de la Carrera, Impressor del Reyno, 1654. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
(2) Ainda estava em vigor a chamada União Ibérica (1580 - 1640). 


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