quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Por que elefantes eram admirados em Roma (e fora dela)

Banho, diversão ou ritual de purificação?

Desde que, lutando contra o exército de Pirro, haviam visto os primeiros elefantes, os romanos ficaram fascinados por eles. A princípio tiveram medo, mas depois, com alguma convivência, passaram a admirar esses animais, de modo que ter alguns em um triunfo tornou-se uma grande atração. O primeiro a ter essa honra, de acordo com Plínio (¹), o Velho, foi Lúcio Metelo, que capturara os animais em guerra contra os cartagineses - para um general romano deve ter sido o auge do glamour. Outro que teve elefantes no triunfo foi Pompeu (²), todavia com um incidente infeliz: os animais puxavam seu carro triunfal, mas por causa do tamanho foram incapazes de passar pela porta da cidade (³).
É fato comprovado que elefantes são muito inteligentes, capazes de demonstrar afeto e, em alguns lugares, ajudam no trabalho como autênticos guindastes vivos. Ao que parece, a notícia dessas habilidades já era do conhecimento de Plínio que, com enorme exagero, escreveu: "O maior animal terrestre é o elefante, que muito se aproxima do homem em sensibilidade e inteligência, entende a linguagem de sua terra de origem, obedece ordens, lembra-se de tarefas realizadas, tem senso de afeição e honra, e até virtudes raras em humanos, como probidade, prudência, equidade, reverência pelas estrelas e veneração pelo Sol e a Lua." (⁴)
Acham pouco, leitores? Há mais: ainda de acordo com Plínio, houve um elefante que chegou a ser capaz de escrever em grego (⁵). Devia usar a tromba, suponho...
Era tão grande admiração que romanos tinham pelos proboscídeos, que chegavam a crer que, livres na natureza, elefantes africanos faziam, a cada lua nova, uma espécie de peregrinação a um rio para nada menos que um ritual de purificação. Sim! Vamos novamente à Naturalis historia de Plínio: "Alguns autores afirmam que na Mauritânia, quando começa a lua nova, vão até um rio chamado Amilo, onde, aspergindo água sobre si mesmos, solenemente se purificam e saúdam a Lua [...]" (⁶). 
Todo mundo sabe que elefantes gostam de brincar com água e lama, com salutares resultados práticos para sua pele. Daí a rotular tal coisa como religião, vai uma distância enorme (⁷). Mesmo para elefantes.

(1) Cf. Naturalis historia Livro VII.
(2) Ibid., Livro VIII.
(3) Lembrem-se, leitores, de que Roma, como outras grandes cidades da Antiguidade, era cercada por muralhas.
(4) PLÍNIO. Naturalis historia Livro VIII.
(5) Ibid.
(6) Ibid.
(7) É difícil saber quanto Plínio acreditava nessas coisas. Foi um dos grandes gênios da Antiguidade, mas era também um homem de seu tempo, coisa de que ninguém consegue escapar. Às vezes, em Naturalis historia, é capaz de contrariar crenças populares da época (viveu entre 23 e 79 d.C.), mas também admite muita tolice como se fora fato real. Apesar disso, devia ser admirado pelos leitores contemporâneos e, até hoje, é muito interessante, mas por razões algo diferentes das que fizeram dele um escritor respeitado na Antiguidade.


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2 comentários:

  1. Hoje não consigo resistir a uma pequena provocação, começando por citar a Marta: "É difícil saber quanto Plínio acreditava nessas coisas. Foi um dos grandes gênios da Antiguidade, mas era também um homem de seu tempo, coisa de que ninguém consegue escapar".
    Pois é. Para além da capacidade de vermos à distância, baseados em factos e fontes históricas - mas que, conceda-me, dependem muitas vezes duma interpretação muito própria, influenciada por diversas correntes de pensamento - seremos sempre pessoas do nosso tempo. Logo, sujeitas ao erro, por mais ínfimo que seja. E isso leva-me a questionar: muitas supostas certezas dum momento histórico não levantam sempre grandes dúvidas? Como aferir, por exemplo, onde começa e onde acaba a veracidade dos testemunhos de Plínio?
    Por hoje fico-me por aqui, Marta, na certeza de que terá resposta à altura. :)

    Fique bem! :)

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  2. Hahaha, é nisso justamente que está a graça: construímos, desconstruímos e tornamos a construir, sem nunca achar que o trabalho está terminado. Veja o caso de Plínio: olhava o mundo da perspectiva de um indivíduo do sexo masculino, pertencente à elite romana do Século I e que ocupava um cargo importante na marinha imperial, fato que lhe proporcionava viagens frequentes, coisa que quase ninguém em seu tempo podia fazer. Ao que parece, era um cético moderado, até para manter as aparências. O ceticismo absoluto cairia mal em seus dias. Tinha vantagens e limitações.
    Assim também acontece conosco. Vivemos no Século XXI, tentando "entender a cabeça" de gente que viveu há muito tempo. Descobrimos pontos em comum, bem como divergências, mas muito daquilo que acreditamos ser fato não passa de interpretação, sujeita a nuances e variações de perspectiva. Outros virão, concluindo que estamos errados... E errarão, também, ainda que cheguem a acertar bastante.
    Afff, isso é coisa da filosofia da História rsrsrssssssssssss

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