terça-feira, 30 de julho de 2019

Como espanhóis, sendo pouco numerosos, conseguiram dominar importantes povos indígenas da América

A chamada "conquista da América" foi rápida, se considerarmos que espanhóis eram poucos em número e tiveram de enfrentar, em alguns casos, verdadeiros impérios. Há, para isso, várias explicações, que se complementam. Aqui estão algumas delas:
  • Os "conquistadores" atacavam de surpresa;
  • Usavam armas de fogo, que davam uma vantagem acentuada, não só pela letalidade, mas porque permitiam atacar sem contato físico direto, de tal modo que, às vezes, os indígenas sequer sabiam de onde os tiros partiam;
  • Cavalos, até então desconhecidos no Continente Americano, asseguravam deslocamento rápido e funcionavam como um fator poderoso de intimidação;
  • Tinham o "trabalho" facilitado pelas doenças que, mesmo sem intenção, propagavam entre os indígenas, que, sem qualquer imunidade contra elas, morriam em massa;
  • Em alguns casos, conseguiam tirar proveito das crenças religiosas locais, que admitiam a aparição de deuses;
  • Fomentavam e tiravam partido das rivalidades entre diferentes grupos indígenas;
  • Finalmente, de acordo com o dominicano frei Bartolomé de las Casas, heroico defensor dos indígenas no Século XVI, espanhóis usavam o terror como arma de grande eficácia:  "Sempre foi determinação em todas as terras em que entraram os espanhóis, a saber, fazer uma matança cruel e assinalada, para que aquelas ovelhas mansas [os índios] ficassem amedrontadas" (*).
Coincidência ou não, alguns desses expedientes foram usados, em certos casos, na colonização do Continente Africano, evidência de que, na perspectiva dos "conquistadores", funcionavam mesmo.

(*) LAS CASAS, Bartolomé de. Brevísima Relación de la Destrucción de las Índias. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.


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quinta-feira, 25 de julho de 2019

Um quilombo junto ao rio Tietê

Quando se fala em quilombo, Palmares vem à mente da maioria das pessoas. Foi, de fato, o mais famoso, tanto pelas proporções alcançadas quanto pela resistência. Mas não foi o único. Muitíssimos outros existiram, nos mais diversos pontos do Brasil. Houve um, de acordo com Hércules Florence, desenhista da Expedição Langsdorff (¹), às margens do rio Tietê, em algum lugar, portanto, do território que hoje pertence ao Estado de São Paulo:
"[...] passamos pela embocadura do rio Quilombo e, pouco abaixo, pela ilha e cachoeira do mesmo nome. Ali se haviam antigamente refugiado muitos negros, pois quilombo é palavra que designa o asilo onde eles se reúnem nas matas. Foram descobertos por negociantes que voltavam de Cuiabá (²) e que, apenas chegados a Porto Feliz, armaram, por espírito de ganância, uma expedição com a qual atacaram aqueles infelizes, aprisionando mais de cento e vinte. Amontoados em canoas, voltaram os mal-aventurados aos pontos em que sofriam o cativeiro. Foi-nos o fato contado pelo guia." (³)
Florence foi didático em suas explicações. Registrava os acontecimentos para si mesmo, mas é possível que imaginasse que eventuais leitores de seus escritos talvez desconhecessem as circunstâncias do escravismo no Brasil. Quilombos não eram incomuns, tampouco o eram as expedições para destruí-los. Captores de escravos queriam, se possível, encontrar quilombolas vivos, para reconduzi-los à escravidão. Este quilombo das margens do Tietê foi apenas mais um, a abrigar - quem saberá por quanto tempo? -, os sonhos de liberdade de quem fugia do cativeiro.

(1) A Expedição Langsdorff saiu de Porto Feliz no dia 22 de junho de 1826.
(2) Monçoeiros, infere-se. 
(3) FLORENCE, Hércules. Viagem Fluvial do Tietê ao Amazonas de 1825 a 1829. Brasília: Ed. Senado Federal, 2007, p. 38

terça-feira, 23 de julho de 2019

Apolo e Jacinto

Jacinto (Hyacinthus orientalis)
É mais uma lenda da antiga Grécia, que explica, não sem um toque de triste lirismo, a origem do jacinto (*). Apolo, filho de Zeus e deus-sol dos gregos, tinha um amigo humano, um pastor de ovelhas, cujo nome era Jacinto. Os dois jovens gostavam de compartilhar entretenimentos, um dos quais consistia no arremesso de discos de chumbo. 
Certo dia, enquanto praticavam esse esporte reconhecidamente perigoso, um disco lançado por Apolo atingiu Jacinto na cabeça, fazendo-o ir ao chão. Em desespero, o deus notou que havia sangue a escorrer da fronte do amigo, que, em pouco tempo, morreu. Do sangue de Jacinto, dizia a tradição helênica, nasceu uma flor, à qual Apolo, choroso, atribuiu o nome do amigo que acabara de perder.
Essa lenda, em sua simplicidade, é bastante reveladora quanto àquilo que os antigos gregos criam, em relação às felizes divindades do Olimpo. Primeiro, nem mesmo os deuses, a quem supunham imortais, escapavam ao fatalismo, ao destino imutável, que os gregos entendiam pautar a existência dos homens. Além disso, ainda que poderosos, os deuses estavam longe da onipotência: o desastrado Apolo que, sem qualquer intenção perversa, matara o amigo Jacinto, não foi capaz de trazê-lo de volta à vida. Finalmente, ao explicar a origem de árvores, flores, e uma infinidade de outras coisas por meio de episódios relacionados aos deuses, os gregos não estavam só fazendo poesia. Essas eram suas crenças religiosas. A nós, que buscamos e encontramos na ciência a explicação para os fenômenos naturais, é que suas lendas, umas alegres e até cômicas, outras dolorosamente trágicas, soam poéticas. Exceto pela imortalidade que caracterizava os habitantes do Olimpo, deuses e homens eram muito parecidos. 

(*) Há alguns questionamentos quanto à verdadeira flor que a lenda evoca, mas o Hyacinthus orientalis não é, ao menos no aspecto, incompatível, ainda que, em sua forma atual, talvez não seja exatamente a espécie que os antigos gregos conheciam.    


quinta-feira, 18 de julho de 2019

O primeiro porco e a primeira vaca de leite levados às minas de Goiás

Cidade de Goiás, fundada em 1729 por
Bartolomeu Bueno da Silva e pela gente que o
acompanhava na procura de jazidas auríferas
Depois de muita procura, encontrou-se ouro no Brasil. Foi isso pelo final do Século XVII. No centênio seguinte, as explorações levaram ao achado de jazidas auríferas também em Goiás. O caso é que, liderados pelo mais que famoso bandeirante Bartolomeu Bueno da Silva, o Anhanguera, homens famintos por ouro estabeleceram povoados que, nascendo quase que literalmente do dia para a noite, não podiam contar com fontes confiáveis de suprimentos. 
Assim, se o ouro aparecia em profusão, por outro lado faltava comida, faltava vestuário básico. Os preços, em consequência, eram monstruosos. Luís d'Alincourt, um oficial português do Real Corpo de Engenheiros, esteve em Goiás no Século XIX e deve ter ouvido quem ainda contasse algo desses tempos de preços escabrosos, porque escreveu: "[...] por toda a parte entraram aqueles homens a revolver a terra para colherem só o único fruto de seus cuidados; a agricultura foi inteiramente desprezada, e só os vivandeiros, que de contínuo estavam a  chegar de São Paulo, tiravam sólidos e avultados lucros, e eram senhores de taxar os gêneros, que subiram naquela época a grandes preços; basta dizer-se que o alqueire de farinha de milho custava dez, e onze oitavas de ouro, o deste grão seis, e sete; o primeiro porco que apareceu (1), vendeu-se por oitenta, e a primeira vaca de leite por duas libras de ouro [...]." (2) 
Quanto valeriam estas coisas, atualmente? É difícil determinar com exatidão, porque seria necessário avaliar o poder de compra na época, mas algumas contas simples podem ser úteis. Consideremos:
  • uma oitava equivalente a cerca de 3,58 gramas;
  • um alqueire equivalente a 13,8 litros (³);
  • uma libra equivalente a 0,453 gramas;
  • uma arroba equivalente a cerca de 14,7 quilogramas. (⁴)
Então, um alqueire de farinha de milho, ou seja 13,8 litros, era vendido por, no mínimo, 25,8 gramas de ouro; um alqueire de milho, por mais de 21 gramas de ouro; uma vaca de leite, por duas libras de ouro, ou seja, 0,906 gramas; finalmente, o porco, que passava por ter sido o primeiro a pôr as patas nas minas de Goiás {ainda que contra a própria vontade, e para um infeliz propósito), vendeu-se por oitenta oitavas, ou seja, 286,4 gramas. Quem tiver a curiosidade, poderá verificar a cotação do dia do grama de ouro, e, fazendo mais algumas contas, chegará a ter uma ideia do preço dessas mercadorias naqueles tempos que já vão longe.

(1) Dizer que "apareceu" parece um tanto injusto.
(2) ALINCOURT, Luís d'. Memória Sobre a Viagem do Porto de Santos à Cidade de Cuiabá. Brasília: Ed. Senado Federal, 2006, p. 78.
(3) A correspondência para essa medida era variável.
(3) Essas correspondências são aproximadas.


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terça-feira, 16 de julho de 2019

Tentaram mudar o nome do Estreito de Magalhães

Fernão de Magalhães era português, mas, a serviço da Espanha, comandou a primeira viagem de circum-navegação. É fato que não pôde completá-la, porque morreu em combate nas Filipinas, mas Juan Sebastián Elcano conduziu de retorno à Espanha o último navio que restou da expedição, concluindo a quase inacreditável viagem em cerca de três anos. Por conta desse feito notável, o nome de Magalhães foi atribuído ao Estreito no sul da América do Sul, mas também a lugares bem mais distantes, como as chamadas Nuvens de Magalhães (galáxias, na verdade).
Parece, contudo, que, no Século XVI, causava certo incômodo a navegadores espanhóis que o Estreito fosse dito "de Magalhães", porque houve quem tentasse dar-lhe outra denominação. Pedro Sarmiento de Gamboa, enviado a explorar o Estreito em 1579, afirmou, em seu relatório de viagem:
"Faço saber a todos, que para fazer esta viagem e descobrimento, tomei por advogada e padroeira a sereníssima senhora Nossa Rainha dos Anjos Santa Maria Mãe de Deus Sempre Virgem, conforme a instrução de Sua Excelência (¹). Por isso, e pelos milagres que Deus Nosso Senhor por sua intercessão há usado para conosco nesta viagem e descobrimento e nos perigos que nela tivemos, pus por nome a este ESTREITO DA MÃE DE DEUS, posto que antes se chamasse ESTREITO DE MAGALHÃES; e espero que Sua Majestade, sendo, como é, tão devoto da Mãe de Deus, confirmará este mesmo nome em seus escritos e provisões, pois eu em seu Real Nome (²) o pus [...]." (³)
Aos que quiserem saber se Sarmiento foi bem-sucedido em sua ideia de mudar o nome do Estreito de Magalhães, aconselho, como resposta, uma rápida vista a meia dúzia de mapas, quaisquer que sejam, desde que da América do Sul. Não será preciso mais que isso. 

(1) Referia-se ao vice-rei do Peru.
(2) Como os navegadores tinham ordem para tomar posse das terras que descobriam em nome do respectivo rei, Pedro Sarmiento deve ter entendido que estava autorizado, também, a mudar o nome de um lugar anteriormente descoberto.
(3) GAMBOA, Pedro Sarmiento de. Viaje al Estrecho de Magallanes. Madrid: Imprenta Real de la Gazeta, 1768, pp. 239 e 240. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.


quinta-feira, 11 de julho de 2019

Montanha-russa fazia sucesso no Rio de Janeiro no final do Século XIX

"Os altos e baixos, os atoleiros e atascadeiros, consolidados com gravetos e varreduras de capinas, transformaram o caminho do bonde, naquele trecho, numa montanha-russa, com a lembrança, de um lado e outro, do espetáculo do que seriam ou do que são os caminhos do nosso interior, pelos quais nos chegam os cereais e a carne que comemos."
Lima Barreto, Clara dos Anjos

No Século XIX, montanhas-russas faziam muito sucesso entre apreciadores de diversões em cidades europeias e nos Estados Unidos. O brinquedo, que ganhara, aos poucos, certo grau de complexidade, era um pequeno desafio à coragem, sem que os usuários corressem riscos enormes. 
No entanto, leitores, a montanha-russa que hoje nos interessa foi instalada no Rio de Janeiro, que era a capital do Brasil. Vejam como é interessante este anúncio (¹), publicado no jornal Semana Sportiva em 10 de março de 1900:


Seria apenas mais um anúncio, publicado, como tantos outros, para atrair clientes, não fosse este comentário, que apareceu no mesmo jornal, edição de 24 de março, também de 1900:
"Continua a constituir um sucesso colossal a montanha-russa circular do parque Eden Floresta, à rua do Riachuelo.
Em boa hora lembrou-se o Sr. Custódio de Castro de montar ali a agradabilíssima diversão, pois ela concorreu consideravelmente para quebrar a monotonia da vida fluminense." (²)
Sim, sim, é provável que o jornal estivesse fazendo, neste caso, um reforço às intenções de seu anunciante. Mas não é isso que surpreende, e sim as últimas palavras, "ela [a montanha-russa] concorreu consideravelmente para quebrar a monotonia da vida fluminense". Não é essa a ideia popular quanto ao quotidiano no Rio de Janeiro e seus arredores na época de que tratamos, como sede de governo que era, da República há pouco estabelecida.

(1) SEMANA SPORTIVA, Ano XI, nº 376, 10 de março de 1900. O original pertence à BNDigital. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.

terça-feira, 9 de julho de 2019

Por que os bons cidadãos romanos deveriam querer governar

Marco Túlio Cícero (²)
Poderia parecer confortável, tentador mesmo, para um romano abastado e instruído, gastar os dias em sua propriedade agrícola, longe das agitações de Roma. Nobremente ocupado em alguma atividade intelectual amena, somente ergueria os olhos dos papiros e pergaminhos para certificar-se de que a famulagem estava bastante ocupada. Assim entretido, não correria o risco de perder a cabeça, literalmente, por ser envolvido, com justiça ou não, em alguma agitação política.
Perfeito? Não para Marco Túlio Cícero. Em De re publica (¹), apresentou razões que deveriam conduzir os bons cidadãos romanos ao envolvimento pessoal no governo da República. São elas:

a) O dever cívico de servir no governo da pátria
"A pátria nos gerou e educou, não para que atendêssemos a nossos interesses, [...], mas para que em seu proveito empregássemos o que há de melhor em nossa alma, gênio e razão, ficando para nosso uso particular o que sobrar do que a ela se destina." (³)

b) Assumindo o governo, os bons não teriam de se submeter ao governo dos maus
"[...] como se aos bons, fortes e de grande capacidade houvesse causa mais justa para desejar o comando da República que o desejo de fugir à obrigação de se submeter ao governo dos maus [...]."

c) Governar tornaria os homens semelhantes aos deuses
"Nada torna o homem mais semelhante aos deuses que fundar cidades (⁴) e conservar as existentes."

Quanta modéstia! Cícero, porém, acabaria experimentando o lado venenoso de atuar no governo de Roma, mas não viveu para contar: perseguido por se opor a Marco Antônio, foi executado em 43 a.C.

(1) O ano 51 a.C. é apontado como a data provável em que Cícero escreveu De re publica.
(2) HEKLER, Anton, Die Bildniskunst der Griechen und Römer, Stuttgart: Julius Hoffmann, 1912, p. 159.
(3) Os trechos citados de De re publica, todos do Livro I, foram traduzidos por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
(4) Cícero provavelmente se referia à fundação de cidades-Estado.


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quinta-feira, 4 de julho de 2019

Dom João III e a escolha do lugar para a primeira capital do Brasil

O malogro trágico da capitania concedida a Francisco Pereira Coutinho - até esse donatário foi petiscado em um festim antropofágico - deu lugar, após algumas controvérsias, a que Dom João III, a fim de centralizar a administração portuguesa no Brasil, determinasse o lugar aproximado para a sede do Governo-Geral que criava. Nas palavras de Antônio de Santa Maria Jaboatão (¹), o rei "determinou tomá-la (²) a si [...], noticioso com a verdade de sua espaçosa enseada, dos muitos e grandes rios que nela entravam, nas margens dos quais se podiam fabricar muitos engenhos e rendosas fazendas, e que ficando situada no meio destas costas do Brasil, podia ser um como coração de toda essa Província, e de onde pudesse acudir a todas as mais capitanias, como a membros seus, e assim edificar nela uma cidade, que fosse cabeça de todo o Estado" (³).
Tudo, no entanto, estava por construir, e decretos, por bonitos que sejam, não fazem brotar povoações e prédios públicos, a menos que se ponha mãos à obra. Dom João III estava longe do Brasil, mas tinha consciência de que era preciso agir nesse sentido, de modo que nomeou Tomé de Sousa como primeiro governador-geral e dispôs o necessário para que viesse à América do Sul acompanhado de gente que pudesse trabalhar para dar ao Brasil sua primeira capital, a Cidade da Bahia, ou Salvador, como a chamamos hoje. Exagerou, contudo, no número de funcionários públicos embarcados. Era gente demais para a administração, enquanto a cidade a ser fundada requeria, por suposto, homens de ofícios mecânicos. Por muito tempo o Brasil sofreria a falta de mão de obra especializada.
Não se imagine, porém, que donatários de outras capitanias tenham recebido felizes as novas da criação do Governo-Geral. Nem podia ser assim, porque o novo sistema retirava poderes que antes estavam em mãos dos capitães-donatários. Ainda citando Jaboatão, a Tomé de Sousa o rei "deu poder e alçada sobre todos os senhorios e proprietários das mais capitanias, por um novo Regimento, pelo qual derrogava e cassava a todos os poderes que nelas tinham, assim no crime como no cível, de que se seguiam os grandes incômodos e notáveis violências que o tempo havia mostrado, pelo muito poder e independência com que as governavam os seus donatários (⁴), do que eles apelaram perante o rei, e não foram, com justa causa, providos, por entender assim a Majestade era o mais conveniente ao bom regime dos seus povos e adiantamento das mesmas conquistas" (⁵).
Esses, leitores, eram tempos de absolutismo monárquico. Podiam os donatários espernear quanto quisessem. Em última análise, era o rei quem mandava, e ponto final.

(1) Nascido em Pernambuco em 1695, foi escritor importante no Século XVIII.
(2) A Capitania da Bahia de Todos os Santos, que fora de Francisco Pereira Coutinho.
(3) JABOATÃO, Antônio de Santa Maria O.F.M. Novo Orbe Serafico Brasilico, ou Crônica dos Frades Menores da Província do Brasil  Volume 1. Rio de Janeiro: Typ. Brasiliense, 1858, pp. 121 e 122.
(4) Ou aqueles que governavam em nome dos donatários, já que alguns deles sequer chegaram a pôr os pés no Brasil.
(5) JABOATÃO, Antônio de Santa Maria O.F.M. Op. cit., p 122.


terça-feira, 2 de julho de 2019

O que se entendia por "mundo habitado" na Antiguidade

A expressão "mundo habitado" foi usada por vários autores da Antiguidade, mas, se não for devidamente compreendida por leitores de hoje, pode levar a ideias distorcidas. 
O melhor, portanto, é deixar que fale Estrabão (¹), que escreveu amplamente sobre os conhecimentos geográficos dos gregos e romanos de seus dias. "Chamamos mundo habitado", afirmou ele, "àquele que habitamos e conhecemos" (²). Fica evidente, portanto, que, com o uso dessa expressão, não havia nenhum propósito de abarcar a Terra em sua totalidade, cuja forma, aliás, ainda era alvo de discussões, embora as pesquisas de Eratóstenes já fossem amplamente conhecidas, inclusive pelo próprio Estrabão, que, em sua Geografia, fez referência a elas. 
Estrabão achava que o "mundo habitado" era "cercado pelo mar, tal qual uma ilha" (³), e que fora dele podia haver outras áreas habitadas, mas não por homens como os greco-romanos e outros povos de áreas próximas. Esse ponto de vista tinha como pressuposto a ideia de que a humanidade somente poderia viver em regiões temperadas, e, admitindo que houvesse na Terra outras áreas (⁴), apenas seres que, na aparência, fossem diferentes dos humanos conhecidos é que poderiam nelas viver. Ficava, assim, aberta a porta para a imaginação.

(1) c. 63 a.C. - 24 d.C. 
(2) ESTRABÃO, Geografia, Livro I.
(3) Ibid., Livro II. Os trechos da Geografia de Estrabão citados nesta postagem foram traduzidos por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
(4) Estrabão considerava a existência de uma "zona tórrida" e tinha conhecimento de uma "região ártica", além da "região temperada", na qual vivia.