Embarcações portuguesas contavam com marinheiros de diferentes nacionalidades
A maioria dos navegadores que, nos séculos XV e XVI, lançou-se a dominar os oceanos era, sem dúvida, composta por marinheiros profissionais, gente experimentada nas asperezas do ofício. A despeito disso, não conseguiam deixar de lado o entusiasmo pelo que viam nas "novas terras", como sobejamente o demonstram a Carta de Caminha e outros documentos, como o Diário da Navegação de Pero Lopes de Souza (¹), já mencionado nas postagens precedentes desta série (Parte I e Parte II), no qual podemos ter uma ideia do deslumbramento dos europeus ante a paisagem do Continente Americano, pelo que lemos no seguinte trecho:
"Eu trazia comigo alemães e italianos, e homens que foram à Índia e franceses - todos eram espantados da formosura desta terra; e andávamos todos pasmados que nos não lembrava tornar." (²)
Note-se que Pero Lopes indica haver com ele homens de várias nacionalidades, o que demonstra que as navegações, encabeçadas principalmente por Portugal e Espanha, contaram, como empreendimento, com a participação de pessoas que eram contratadas devido à sua experiência e coragem, independente das origens. E, que isso não ocorreu apenas na expedição comandada por Martim Afonso (irmão de Pero Lopes, cujo Diário citamos) e que não incluía apenas europeus, mas também africanos, pode-se ver, por exemplo, no Livro da Nau Bretoa (³), que refere a presença de negros como grumetes:
"Antonio [...] negro criado de Ruy Gomes
Antonio negro escravo de Artur Henriques
Bastiam escravo de Bartolomeu Marchone " (⁴)
Neste caso, o primeiro devia, provavelmente, ser de condição livre, sendo os dois últimos explicitamente citados como cativos. O aspecto interessante é que o primeiro escravo é descrito como "negro africano", mas, quanto ao segundo, não se especifica a origem. Há, além disso, no restante da lista dos navegantes da expedição, vários outros cuja nacionalidade não é identificada, mas seus nomes sugerem que talvez não fossem portugueses, sem omitir que, dos quatro armadores, dois deviam ser italianos, pois são, na ortografia da época, chamados "Bertolameu Marchone" e "Benadyto Morelle".
Além dos marinheiros de profissão havia, porém, quem viesse às Américas em busca de aventura - do que Hans Staden, com muita probabilidade, deve ser o mais famoso exemplo. Seja como for, para muitos marinheiros ou aventureiros, as terras recém-descobertas pareciam ser um lugar encantado, a ponto de não quererem retornar. Quanto a isso, concluímos com uma última citação do Diário da Navegação, no qual se registra, em julho de 1532:
"Aqui se lançaram com os índios três marinheiros da minha nau, e me detiveram oito dias buscando-os e não os pude haver por os índios mos esconderem." (⁵)
Estes, por certo, fizeram parte do grande número de europeus que, integrando-se à vida dos aldeamentos indígenas, começaram a lançar as bases de uma cultura tipicamente mameluca, que, por séculos, caracterizou algumas regiões do Brasil e que ainda hoje persiste em determinados lugares.
(1) Rio de Janeiro: Typ. de D. L. dos Santos, 1867.
(2) Página 54.
(3) Que partiu de Lisboa com destino ao Brasil em fevereiro de 1511 - anterior, portanto, à expedição de Martim Afonso, da qual também fazia parte Pero Lopes de Souza.
(4) Na mesma edição do Diário da Navegação de Pero Lopes de Souza, p. 105.
(5) Página 70.
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