Depois da derrota da seleção brasileira de futebol (em jogo contra a Holanda) na Copa do Mundo, as ruas ficaram desusadamente silenciosas, apesar do movimento de pessoas que retornavam ao trabalho. Funcionários de lojas, com evidente desânimo, começaram a retirar a decoração verde-amarela, havendo comerciantes que chegaram a expressar sua decepção, dizendo que "com a Copa, estávamos vendendo mais, as pessoas tinham ficado mais dispostas a gastar".
Considero perfeitamente normal em um país como o Brasil, no qual o futebol tem um significado social muito grande, que haja uma certa tristeza decorrente da eliminação do selecionado nacional, justamente em sua competição mais importante. O que não me parece adequado é ver bandeiras do Brasil espalhadas pelo chão, ou ainda sendo descuidadamente removidas de vitrines, como se fossem apenas as bandeiras de um clube de futebol qualquer. Tudo isso me leva a conjecturar que, para uma parcela razoável da população, o Brasil é visto mais ou menos como um grande time pelo qual se torce em momentos nos quais as rivalidades de torcidas são esquecidas, senão superadas, em favor do "super-time" que é, ainda que apenas no plano imaginário, a seleção brasileira. Nessas ocasiões é usual aplaudir, por ser brasileiro, o mesmo jogador que, semanas antes, havia sido injuriado por jogar pelo time adversário em uma partida no campeonato nacional. Estranho cimento é o futebol, capaz de forjar, ainda que por poucos instantes, uma unidade nacional que de outro modo não se consegue fazer emergir!
Mas voltemos ao assunto das bandeiras dispersas pelas calçadas. O fato de que sejam tratadas com tão pouca consideração é reflexo, a meu ver, de uma falta quase absoluta de educação para a cidadania. Não estou propondo a ressurreição da tristemente famosa Educação Moral e Cívica, mas o desenvolvimento de uma consciência dos privilégios e obrigações da condição de cidadão, o que inclui, ainda que perifericamente, a compreensão de que a bandeira é um símbolo de todos os brasileiros, e não apenas de campos, matas, minas de ouro, céu azul e outros aspectos "naturais". Deveria estar suficientemente claro que quem a desrespeita, está praticando ato ofensivo ao corpo de cidadãos que constitui o país, o que inclui, por suposto, o próprio ofensor.
Mas como esperar algo diferente do que se vê? Se a seleção brasileira vence, então todos vencem e comemoram. Se é derrotada, a culpa é dos jogadores... Talvez fosse importante avaliar como essa postura pode ser extrapolada para toda a vida civil, particularmente no âmbito da política, com suas consequências para o grau de envolvimento pessoal dos cidadãos em questões que interessam a todos, mas que são deixadas nas mãos de poucos, sem que haja verdadeiro interesse pelos rumos do país. Nesse quadro, não chega a espantar que a bandeira do Brasil seja vista apenas como mero objeto publicitário - descartável, e nem sempre reciclado - apenas para aumentar o trabalho dos coletores de lixo, quando não mais se precisa dela para elevar as vendas.
Veja também:
Marta, eu fico muito intrigado com este "patriotismo" de meia tigela, forjado nas competições esportivas (digo isso sem querer igualar-me a um bocado de pseudo-intelectuais que dizem o mesmo). Todo mundo é patriota na hora de torcer durante a Copa. Todo mundo é especialista na hora de criticar a convocação do Dunga.
ResponderExcluirEste mesmo interesse é necessário em questões relevantes para o país, tais como o pré-sal e todas as suas implicações políticas e econômicas, só pra citar um exemplo. Mas nesta hora o povo fica caladinho e deixa os políticos (sim, os mesmos que mantêm este debate afastado do povo e que são votados pelo mesmo povo) resolverem entre eles.
É mais curioso ainda como o povo lê uma meia dúzia de linhas na imprensa e se acha especialista em tudo, capaz até mesmo de opinar sobre o pitot que falhou no avião da Air France, sendo que no dia anterior o mesmo povo nem sabia que o tal pitot existia.
No futebol a coisa muda, o povo se interessa e faz disso questão de vida ou morte. Um catatau de gente se reúne pra receber a seleção no aeroporto, pra aplaudir nas vitórias e xingar em momentos como o atual; mas ninguém protesta contra os políticos, nem faz manifestações no aeroporto. Somente os mesmos baderneiros de sempre vão ao Congresso Nacional ou às Prefeituras e Assembleias Legislativas para promover quebra-quebra, fechar ruas, querer brigar com a polícia e etc. Não por patriotismo, mas por interesse.
Perfeito. É isso mesmo!
ResponderExcluir