terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Botas impermeáveis para D. José I

Quem se lembra de D. José I? Nascido em 1714, foi rei de Portugal de 1750 até sua morte em 1777. Ocupava o trono, portanto, quando, em 1755, aconteceu o terrível terremoto que fez tremer as terras lusitanas (¹). Contudo, D. José talvez seja mais famoso por ter colocado Portugal no círculo do despotismo esclarecido, ao nomear Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, como seu primeiro-ministro. O Iluminismo estava a fazer adeptos, ainda que com variadas nuances, nos meios políticos e intelectuais europeus.
Enquanto isso, no Brasil uma árvore começava a chamar a atenção dos aventureiros que, explorando o sertão à procura de metais preciosos, acabavam encontrando prodígios vegetais que, no futuro, seriam reputados tão interessantes quanto ouro ou prata. Era o caso, por exemplo, da Hevea brasiliensis, que produzia uma goma elástica que os índios já conheciam e utilizavam: a borracha. É verdade que os dias da febril extração da borracha na Amazônia ainda estavam distantes, mas objetos desse material se destacavam porque eram leves, flexíveis e, principalmente, impermeáveis. 
Não demorou e alguém teve a ideia de impermeabilizar calçados usando borracha. Deu certo, a notícia da existência de um material com essas características atravessou o Atlântico e, de acordo com Francisco Bernardino de Sousa (²), D. José I julgou que seria uma grande ideia se suas botas fossem revestidas com borracha: "Conhecido no Pará o uso desse calçado, tornou-se geral e não tardou a passar a Portugal, onde em 1755 já estava tão generalizado que o rei D. José também quis ter botas cobertas de goma elástica e para esse fim remeteu o governo uns poucos de pares para a cidade do Pará (³), a fim de serem convenientemente preparados." (⁴) 
A borracha, porém, servia para muito mais que impermeabilizar calçados. A partir do Século XIX seu uso ganhou proporções revolucionárias e fez a riqueza de alguns nomes ligados à grande indústria internacional. No Brasil, como se sabe, a prosperidade que gerou na região amazônica durou pouco. Dela ficaram apenas lembranças e algumas construções que atestam a existência desse brevíssimo tempo de glória.

(1) Não só elas: o terremoto foi sentido em uma área bem maior.
(2) O cônego Francisco Bernardino de Sousa foi encarregado dos trabalhos etnográficos da Comissão do Madeira.
(3) Belém do Pará.
(4) SOUSA, Francisco Bernardino de. Pará e Amazonas, Segunda Parte. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1875, p. 22.


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2 comentários:

  1. D. José, borracha, Amazónia, Brasil: eis alguns ingredientes mais que suficientes para para estimular múltiplas pesquisas, sem fim à vista. Dos historiadores nem se fala, pois há por aqui pano para muitas mangas (livros).
    Muito grato, Marta.

    Tenha um bom domingo :)

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    1. Não há mesmo limite, nem para as pesquisas, nem para a imaginação :-))))))))))))

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