sexta-feira, 25 de julho de 2014

O culto aos deuses e a importância dos reis-sacerdotes na Antiguidade

Uma característica predominante entre os povos que, na Antiguidade, habitavam a região a que hoje chamamos Oriente Médio, é que os monarcas, fossem eles os governantes de verdadeiros reinos ou de simples cidades, eram apresentados, não como autênticos deuses, mas como seus representantes. Uma consequência lógica desse fato é que os reis eram, quase sempre, também sacerdotes.
Um deus-peixe da
Mesopotâmia (²)
No entanto, o estabelecimento desse fenômeno pode ter ocorrido em ordem inversa: sacerdotes, por seu suposto relacionamento próximo com uma ou com várias divindades, acabavam, pouco a pouco, sendo guindados ao mando político. Afinal, quem melhor para governar que um indivíduo capaz de tratar com os deuses? E, se quisermos buscar mais além, encontraremos raízes profundas na estrutura familiar patriarcal que, ainda em tempos de nomadismo, era bastante comum, embora a sedentarização tenha sido um passo importante no rumo da identificação entre um deus e um determinado território.
Ora, meus leitores, se continuarmos o encadeamento lógico que começamos - sacerdotes tornavam-se reis, mantendo, porém, as funções no âmbito do sagrado - veremos facilmente por que motivo, para a mentalidade oriental, religião e política eram indissociáveis.
Quais eram, então, as consequências práticas dessa teocracia? Vejamos:
- Considerava-se, via de regra, que os deuses, e não os moradores humanos, eram os verdadeiros donos de um determinado lugar (os reis eram seus representantes);
- Era muito importante manter o culto do(s) deus(es) do lugar, para evitar alguma tragédia resultante de seu desagrado (daí decorrendo a grande importância do rei-sacerdote);
- Secas, inundações e outros fenômenos eram vistos como resultado da fúria de uma divindade local, em virtude de alguma falha no culto que se lhe supunha devido, sendo obrigação do rei-sacerdote tomar as providências necessárias para dar ao(s) deus(es) a correspondente satisfação;
Nebu (ou Nebo), 
divindade
da Mesopotâmia (²)
- A religião do lugar adquiria certa conotação de "patriotismo" (¹), resultando, assim, na obrigação de adotá-la para quem vinha de fora da comunidade;
- Finalmente, a maioria dos povos do Oriente Médio não descria dos deuses de seus vizinhos, apenas considerava que, para além do palco das lutas humanas, os deuses todos, dos diferentes reinos, fossem eles grandes ou pequenos, é que travavam as verdadeiras guerras, sendo as vitórias e derrotas humanas apenas a consequência dos combates entre divindades. Deuses mais fortes derrotavam deuses fracos. Portanto, povos dominadores entendiam que tinham um panteão mais poderoso que o dos povos dominados. Isto, é certo, até que aparecesse alguém em condições de derrotar os valentões do dia...
Não, não, senhores leitores, nada de achar tudo isso muito engraçado. Sejamos justos com os antigos. Quanto dessas remotas ideias podemos encontrar, um tanto disfarçadas, é verdade, em nosso moderníssimo mundo ocidental, em pleno Século XXI? Basta apenas escavar um pouquinho para trazer a descoberto as premissas ideológicas que, em última análise, andam na cabeça de muita gente, norteando expectativas e direcionando os rumos da política - em pequena e em larga escala.

(1) Uso o termo, aqui, com muitas restrições, por não me ocorrer, neste momento, um outro mais indicado. Mais tarde e em outro lugar, ou seja, na Península Itálica, entre os romanos, o uso seria mais apropriado, particularmente no chamado "culto ao imperador"; entre os antigos gregos, tão encrenqueiros, como se sabe, que quase não sabiam viver sem pensar em guerra, a religião era vista como um fator de unidade.

(2) LAYARD, Austen Henry. Nineveh and Babylon. 
London: John Murray, 1882.


Veja também:

2 comentários:

  1. Puxa Marta,
    quanta informação boa junta.
    Vejo hoje a coisa da religião
    ainda como voce descreve.
    Muita gente confunde e acaba
    se perdendo dentro dela.

    Estou voltando hoje a comentar nos
    blogs amigos como o seu
    e venho agradecer por sua força
    em meu tempo dificil.
    A morte para mim nunca é o fim
    e sim um marco de uma parada.
    Me disseram isso aos 1 5 anos
    e tenho guardado.
    Linda semana pra nós.
    Com carinho e afeto
    Bjins
    CtiahoAlc./ReflexodAlma

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    Respostas
    1. Obrigada por andar pelo blog. Sua participação é muito importante. Coragem, e siga em frente.

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