Já escrevi neste blog sobre a alimentação dos marinheiros que viajavam de Portugal para o Brasil durante o Período Colonial - quem tiver interesse no assunto, poderá ler "De que se alimentavam os marinheiros e soldados em uma armada portuguesa no Século XVII". Hoje, e também na próxima postagem, faremos a rota em sentido contrário, investigando quais eram os suprimentos providenciados para quem fazia a travessia do Atlântico partindo do Brasil com destino a Portugal.
Vale lembrar que naquela época (mesmo hoje não é muito diferente) havia alimentação para a marujada e passageiros de baixo estrato social, assim como havia coisas reservadas aos altos funcionários administrativos do governo lusitano, bem como a outros passageiros de elevada posição.
Mas vamos ao que interessa. Na segunda metade do Século XVIII uma nau portuguesa, a "Nossa Senhora da Ajuda", fez uma desastradíssima viagem entre o Rio de Janeiro e Lisboa. Sucede que nela viajava um militar, Elias Alexandre e Silva que, depois de sobreviver às maiores peripécias no oceano, uma vez a salvo publicou uma obrinha de título enorme: Relação ou Notícia Particular da Infeliz Viagem da Nau de Sua Majestade Fidelíssima, Nossa Senhora da Ajuda e São Pedro de Alcântara do Rio de Janeiro Para Lisboa. Quase dá pra cansar...
No dito opúsculo, nosso homem descreveu não apenas as desgraças da viagem, como (para nossa sorte), deixou muitas informações valiosas sobre as práticas relacionadas à navegação em seus dias. Entre outras coisas, explicou que, ao sair da Cidade da Bahia (Salvador), tendo vindo do Rio de Janeiro, a nau "Nossa Senhora da Ajuda" teve sua partida atrasada em nada menos que quarenta e oito dias, já que faltava, na cidade, um suprimento adequado do mais importante artigo para alimentação da soldadesca e tripulantes: feijão. Escreveu Elias Alexandre e Silva:
"Ao som de caixas se mandou anunciar ao povo o breve dia da saída da nau. Este porém se demorou com causa justa e necessária, não estando da parte de pessoa humana remediar o que só Deus pode fazer. A antecedente frota, que daquele porto tinha saído, embarcou mantimentos bastantes para a longa viagem de três meses, e por consequência muitos feijões, que é o mantimento de menos preço e mais usual em viagens do Brasil; mas sendo tão necessário, e que em as naus régias se dá à tripulação e guarnição delas, era o que menos havia, e na demora de o mandar vir de longe e em outras diligências, se gastaram quarenta e oito dias." (*)
Entende-se, pois, que a quantidade de feijão necessária era grande; entende-se, igualmente, que a Cidade da Bahia e suas adjacências não tinham como fornecer tanto feijão para duas frotas consecutivas (junto com a "N. Sra. da Ajuda" iam outras sete embarcações menores); entende-se, por último, que o único remédio, nesse caso, era esperar que mais feijão viesse de terra adentro.
Senhores leitores, continuaremos o assunto na próxima postagem.
(*) SILVA, Elias Alexandre e. Relação ou Notícia Particular da Infeliz Viagem da Nau de Sua Majestade Fidelíssima, Nossa Senhora da Ajuda e São Pedro de Alcântara do Rio de Janeiro Para Lisboa. Lisboa: Regia Officina Typografica, 1778, p. 14.
No dito opúsculo, nosso homem descreveu não apenas as desgraças da viagem, como (para nossa sorte), deixou muitas informações valiosas sobre as práticas relacionadas à navegação em seus dias. Entre outras coisas, explicou que, ao sair da Cidade da Bahia (Salvador), tendo vindo do Rio de Janeiro, a nau "Nossa Senhora da Ajuda" teve sua partida atrasada em nada menos que quarenta e oito dias, já que faltava, na cidade, um suprimento adequado do mais importante artigo para alimentação da soldadesca e tripulantes: feijão. Escreveu Elias Alexandre e Silva:
"Ao som de caixas se mandou anunciar ao povo o breve dia da saída da nau. Este porém se demorou com causa justa e necessária, não estando da parte de pessoa humana remediar o que só Deus pode fazer. A antecedente frota, que daquele porto tinha saído, embarcou mantimentos bastantes para a longa viagem de três meses, e por consequência muitos feijões, que é o mantimento de menos preço e mais usual em viagens do Brasil; mas sendo tão necessário, e que em as naus régias se dá à tripulação e guarnição delas, era o que menos havia, e na demora de o mandar vir de longe e em outras diligências, se gastaram quarenta e oito dias." (*)
Entende-se, pois, que a quantidade de feijão necessária era grande; entende-se, igualmente, que a Cidade da Bahia e suas adjacências não tinham como fornecer tanto feijão para duas frotas consecutivas (junto com a "N. Sra. da Ajuda" iam outras sete embarcações menores); entende-se, por último, que o único remédio, nesse caso, era esperar que mais feijão viesse de terra adentro.
Senhores leitores, continuaremos o assunto na próxima postagem.
(*) SILVA, Elias Alexandre e. Relação ou Notícia Particular da Infeliz Viagem da Nau de Sua Majestade Fidelíssima, Nossa Senhora da Ajuda e São Pedro de Alcântara do Rio de Janeiro Para Lisboa. Lisboa: Regia Officina Typografica, 1778, p. 14.
Veja também:
Preciso recuperar postagens anteriores e ir tomar conhecimento da continuação desta.
ResponderExcluirJamais saberia do "pormenor" da importância tão antiga do nosso feijão, se aqui não viesse!
Muito interessante!
A continuação sai amanhã. O título será "Galinhas e Gado ao Mar!". Dá até pra adivinhar de que se trata, não? :-))))
ExcluirMarta, depois desse título, poucos teriam coragem para ler a obra. Os historiadores são uns heróis.
ResponderExcluirE viva o feijão.
Beijinhos
Ruthia d'O Berço do Mundo
Estou de pleno acordo rsrsrsrsssssssssssss!
Excluir