quinta-feira, 22 de julho de 2021

Para entender as religiões do passado

Povos do passado desenvolveram uma infinidade de crenças a que poderíamos dar o rótulo de religiões. Contudo, quem quiser entender corretamente as ideias que, a esse respeito, moravam na cabeça dos antigos, precisa pôr de lado alguns conceitos que nós, ocidentais do Século XXI, comumente associamos à divindade, independentemente das crenças que temos ou deixamos de ter. Estes são alguns aspectos importantes que devem ser considerados:

1. Deuses nem sempre eram descritos como eternos
Em algumas mitologias - mitologias para nós; para os povos do passado, eram religião -, os deuses eram imortais, mas tinham um começo ou nascimento. A mitologia grega se encaixa muito bem neste caso.

2. Nem todos os deuses eram imortais
Por mais estranho que possa parecer, havia deuses que, não somente tinham um começo, como também morriam. Tome-se, como exemplo, o caso de Osíris, do Egito Antigo, que foi morto e esquartejado por seu invejoso irmão, ou de Tamuz, cultuado na Palestina e Mesopotâmia, que morria e ressuscitava anualmente, executando um ciclo que tem sido interpretado como uma associação às estações do ano.

3. Nem todos os deuses eram oniscientes
Como não sabiam, por si mesmos, de tudo o que se passava no mundo, deuses precisavam de informantes - era o caso dos famosos corvos de Odin, na mitologia nórdica. Por outro lado, deuses às vezes tinham um porta-voz, encarregado de levar recados à humanidade, como sucedia com Mercúrio, entre os romanos.

4. Deuses nem sempre eram considerados onipotentes
A maioria dos deuses da Antiguidade era especializada em alguma tarefa, controlava apenas um aspecto da vida ou ainda um fenômeno da natureza, não tendo poder além disso. A variedade, neste ponto, é tão grande, que seria injusto citar exemplos. Basta lembrar que havia deuses da terra, deuses do mar, deuses do mundo dos mortos, deuses das tempestades, deuses que atuavam como protetores de determinadas profissões e assim por diante.

5. Deuses nem sempre eram seres muito virtuosos
Brigas familiares, inveja, ciúmes, adultério, ódio, assassinatos, tudo isso fazia parte da maioria das mitologias. Em alguns casos, como acontecia em relação à mitologia grega, as contendas levavam os deuses a dar palpites e introduzir suas divergências nos acontecimentos humanos. Quem já leu a Ilíada sabe o que isto significa.

6. A jurisdição de cada deus se restringia ao território em que era adorado
O conceito de religião universal foi desconhecido para a maioria dos povos da Antiguidade. Esperava-se que um deus ou deusa protegesse quem vivia no território a ele ou a ela correspondente. Quando os humanos iam à guerra, muitas vezes entendiam que, para além do mundo visível, seus deuses lutavam com eles e por eles. Em consequência, a vitória de um povo era sempre atribuída ao maior poder das respectivas divindades. Ao dominar outro povo, vencedores entendiam que estavam dominando, também, os deuses dos inimigos.

7. Deuses dependiam da assistência humana para comida, bebida e tudo quanto precisavam
Adeptos de muitas ideias religiosas entendiam ser seu dever oferecer aos deuses alimentos, como carne e pão, e bebidas, como vinho ou cerveja, para mantê-los felizes e dispostos a ajudá-los. Essas práticas podiam acontecer no âmbito doméstico, como faziam os romanos no culto de seus antepassados, ou mediante verdadeiras instituições, amplamente apoiadas por monarcas - era o caso da camada social dos sacerdotes no Egito Antigo, com seus muitos privilégios, mas com o dever de cuidar de todas as necessidades materiais dos deuses, fossem eles representados por estátuas ou seres vivos, como os touros e crocodilos sagrados. Suas numerosas exigências deviam manter a elite sacerdotal bastante ocupada.


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6 comentários:

  1. Muito bom chamar atenção para esses pontos. Em aulas é útil para ajudar os alunos a se situarem um pouco mais no modo de ver a existência presente em algumas sociedades antigas. Para quem está começando a pesquisar sobre o tema, é crucial para tomar cuidado nas análises.

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    1. Boa noite, Wendell, concordo integralmente com seu ponto de vista. Embora o estudo da Antiguidade ande meio abandonado em muitas escolas, continua a ser de grande importância.

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    2. Um abandono que piora em regiões como a amazônica. Até na própria academia. Já vi em eventos acadêmicos referências em Ensino de História na região afirmando que não existe sentido em acrescentar História Antiga no Currículo Escolar.

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    3. Já vi muito disso em outros lugares também. Parece que, aos defensores dessa ideia, é razoável privilegiar o estudo da parte em detrimento do todo.

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  2. Boa tarde. Acho que o principal é o respeito às pessoas e a sua fé. Parabéns pelo seu trabalho maravilhoso.

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    1. Certamente! Respeito com a fé que as pessoas têm, e também com as pessoas que não têm nenhuma. Discordar não significa desrespeitar.

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