Historiadores da Antiguidade foram enfáticos em afirmar que os habitantes de Roma, nos primórdios da cidade, prezavam, como virtudes impagáveis, a sobriedade, a frugalidade e o hábito de economizar.
Que dizer? Eles não podiam, mesmo, ser muito diferentes disso. A primitiva aldeia de pastores e agricultores era pobre demais para cultivar gente dada ao luxo.
Porém, com o passar do tempo, vieram as conquistas militares e, com elas, duas coisas aconteceram:
a) Os romanos passaram a copiar alguns costumes estrangeiros que pareciam úteis, ainda que viessem de inimigos que haviam derrotado;
b) O enriquecimento proporcionado pelas conquistas militares abriu caminho para que hábitos de luxo se infiltrassem na sociedade romana.
Tito Lívio, em Ab urbe condita libri, assinala a entrada do luxo na época em que os romanos, sob o comando de Lúcio Cornélio Cipião (¹), também conhecido como "Asiático", derrotaram as forças comandadas por Antíoco III na Batalha de Magnésia (190 a.C.):
"Quando L. Cornélio Cipião voltou a Roma, celebrou-se um notável triunfo e concedeu-se-lhe o apelido de Asiático: seu exército é que começou a introduzir o luxo estrangeiro em Roma." (²)
Ora, meus leitores, o que estava em jogo na Batalha de Magnésia, vencida pelos romanos, era o domínio sobre a Grécia. Podem, portanto, imaginar o botim de guerra em tal ocasião!
Desde o tempo da guerra contra Siracusa (³) os romanos vinham admirando a arte grega. Marco Cláudio Marcelo, o cônsul que comandou a vitória, depois de saquear a cidade derrotada, levou a Roma uma quantidade enorme de obras de arte, que foram consagradas aos deuses, em seus respectivos templos. Segundo Tito Lívio, foi assim que "as obras de arte gregas começaram a ser admiradas em Roma" (⁴).
Mas, acreditem, não foram apenas as grandes obras de arte produzidas por gênios da cultura grega que ganharam a afeição dos romanos. Coisas aparentemente corriqueiras do dia a dia também conquistaram o coração dos outrora sisudos moradores da Península Itálica, cujo principal alimento era uma espécie de mingau de aveia. Conquistaram o coração, sim, mas inclua-se nisso também o estômago: a comida da Grécia, em particular a arte da panificação, enfeitiçou Roma, a tal ponto que se afirma que, nos dias do imperador Augusto, chegou a haver na cidade nada menos que trezentas e vinte e nove padarias públicas.
O jeito romano de fazer as coisas, porém, veio a manifestar-se nesta questão. Para exercer controle e evitar que cada um fizesse o pão como bem entendesse, havia um funcionário público cujo trabalho era fiscalizar continuamente se todos os estabelecimentos de panificação cumpriam seus deveres conforme estipulado, em quantidade e qualidade, quer fazendo o alimento que se vendia para distribuição aos escravos, quer fabricando finíssimos pães, com ingredientes sofisticados, que só frequentavam a mesa dos ricos.
(1) Irmão de Públio Cornélio Cipião, apelidado "O Africano".
(2) Tito Lívio, Ab urbe condita libri.
(3) 212 a.C.
(4) Tito Lívio, Op. cit.
As citações de Ab urbe condita libri que aparecem nesta postagem foram traduzidas por Marta Iansen para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
Veja também:
Bom....o português coloquial ainda conserva a expressão "luxo asiático".
ResponderExcluirMuito provavelmente, tem que se procurar nesta época a origem das "pastas" , "massas" , "pizzarias" , padarias e pastelarias finas que depois se foram espalhando pelo Império.
Roma era a civilização...
Sim, certamente. Mas há também os hábitos de luxo que os cruzados trouxeram das terras orientais, e aqueles que os navegadores dos Séculos XV e XVI "importaram" das Índias. Convenhamos: o sucesso alcançado por artigos de luxo, quer na Antiguidade, quer em tempos mais recentes, serve para provar que, como regra, eram excelentes. Quem é que não iria gostar?
ExcluirTambém concordo que o luxo asiático tem mais que ver com os finíssimos produtos que encontraram no Oriente, a partir dos Descobrimentos. Estou muito contente por terem trazido algumas esquisitices, nomeadamente a canela, que uso todos os dias.
ResponderExcluirBeijinhos
Ruthia d'O Berço do Mundo
Tem razão; a canela, em alguns pratos, faz toda a diferença.
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