quinta-feira, 19 de abril de 2012

A repressão à Inconfidência Mineira no contexto político do Século XVIII

Joaquim José da Silva Xavier,
o Tiradentes, de acordo com um selo
dos Correios do Brasil
A Inconfidência Mineira é tida, ainda, como um movimento precursor da independência do Brasil, a despeito do que alguns têm escrito e debatido contrariamente. Contribui para isso o fato de que foi duramente reprimida, inclusive com a execução por enforcamento de um de seus integrantes. Ora, dirão alguns, por que é que gente que nunca chegou a pegar em armas por uma suposta independência, que, ao que se sabe, não andou publicando manifestos, que apenas discutiu eventualmente o mau futuro que, segundo todas as aparências, parecia aguardar as Minas, a manter-se o governo tal qual andava, por que é que gente até bastante importante foi ostensivamente presa, conduzida em ferros ao Rio de Janeiro, mantida em prisão por bastante tempo para, finalmente, receber pesadas sentenças? Sim, porque embora apenas Joaquim José da Silva Xavier tenha sido executado, vale lembrar que, na época, uma sentença de degredo na África, ainda que temporário, era encarada como uma condenação à morte, ainda que não imediata, já que era comum que degredados morressem em razão de doenças tropicais. Cabem, pois, nesse caso, algumas considerações importantes.
As vilas e cidades do Brasil Colonial respiravam frequentes sedições, revoltas, rebeliões, motins, insurreições, protestos, levantes, conspirações, revoluções - e São Paulo talvez tenha sido o mais acabado exemplo disso tudo. A falta de uma presença efetiva de representantes do governo português pela enorme distância entre Reino e Colônia, a frouxa autoridade de alguns governadores, a audácia dos governados, tudo contribuía para que as ordens reais fossem respeitadas quando se queria, sendo cabalmente ignoradas quando se discordava delas. Que se considere, sobre isso, a questão da escravidão de índios em São Paulo e no Rio de Janeiro. Embora, de acordo com as leis, o enforcamento de rebeldes devesse ser coisa usual (vejam-se as famosas Ordenações, livro V), tendo efetivamente ocorrido em alguns casos, sabe-se de rebeliões, até de alguma importância, que não tiveram as consequências da Inconfidência Mineira. Essa, no entanto, foi duramente reprimida. Por quê?

a) Primeiro, porque aconteceu na área que, naquele momento, era tida como a mais preciosa da Colônia, do ponto de vista de Portugal, ou seja, a região mineradora de ouro, em tempos nos quais o Reino precisava desesperadamente das riquezas vindas do Brasil;

b) Além disso, ocorreu quando a independência das colônias inglesas na América do Norte já era um fato, de modo que a Metrópole lusitana tinha boas razões para crer na possibilidade de que, mais cedo ou mais tarde, a fome por liberdade política acabaria por alastrar-se pelo Continente Americano;

c) As casas reinantes na Europa tremiam diante do fato de que o ideário iluminista andava a espalhar-se como um verdadeiro incêndio que cativava as mentes mais esclarecidas e fazia supor que, também nesse caso, num tempo não muito distante, as velhas tradições ligadas ao absolutismo monárquico seriam varridas do mundo ocidental;

d) Finalmente, resta dizer que, enquanto na Europa acontecia a Revolução Francesa, no Rio de Janeiro era tirada a Devassa da Inconfidência. Era, pois, um tempo de pânico para as monarquias absolutas, daí a severidade da repressão e enorme encenação pública no ato da execução de Joaquim José.

O nome dado ao movimento, "Inconfidência", significa deslealdade, traição, um verdadeiro crime de lesa-majestade. Desde a independência do Brasil, ao longo dos anos do Império, houve uma atitude algo ambígua em relação ao movimento e à figura de Tiradentes, que mais tarde seria guindado à condição de herói da República. Todavia, o nome "Inconfidência Mineira" ficou, embora alguns prefiram chamá-la "Conjuração Mineira". De qualquer modo, temos um exemplo claro de como uma expressão pejorativa e condenatória em suas origens, acabou por ganhar outro sentido, à medida que o correr das décadas levou a uma reviravolta na avaliação que se fez e faz do movimento ocorrido nas Gerais em fins da penúltima década do século XVIII.


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