Aqui os coelhos da Páscoa ocupam um carro de passageiros da antiga Ferrovia Mogiana em Monte Alegre do Sul - SP |
Quem é que nunca teve a sensação de que "o tempo não passa", quando mais se deseja apressar algum evento, ou de que "passa rápido demais", quando se gostaria de prolongar alguma coisa pela eternidade? Pois há um trechinho de Machado de Assis que é fantástico no referir-se à percepção humana do tempo, percepção essa que pouco ou quase nada tem a ver com o tempo dos relógios, por mais precisos que sejam. E, como esse excerto trata justamente da Semana Santa, vem em boa hora (sem trocadilho):
"As semanas santas de outro tempo eram, antes de tudo, muito mais compridas. O Domingo de Ramos valia por três. As palmas que traziam das igrejas eram muito mais verdes que as de hoje, mais e melhor. Verdadeiramente já não há verde. O verde de hoje é um amarelo escuro. A segunda-feira e a terça-feira eram lentas, não longas; não sei se percebem a diferença. Quero dizer que eram tediosas, por serem vazias. Raiava, porém, a quarta-feira de trevas; era princípio de uma série de cerimônias, e de ofícios, de procissões, sermões de lágrimas, até o Sábado de Aleluia, em que a alegria reaparecia, e finalmente o Domingo de Páscoa que era a chave de ouro." (*)
Machado escreveu em 1894 e falava, então, das "semanas santas de outro tempo"... Cabe, antes de mais nada, considerar que a Semana Santa das memórias de Machado de Assis era uma celebração essencialmente religiosa, não se podendo dizer o mesmo das de nosso século. Meus leitores de mais idade talvez tenham suas histórias para contar, como muitas que já ouvi, da busca por ovos de Páscoa coloridos (sim, ovos de galinha!), nos gramados das casas, fossem elas nas cidades ou pequenas propriedades rurais onde residiam. Chocolate, por sua vez, já foi muito mais caro do que é hoje, de modo que ovos de Páscoa eram, com certeza, ansiosamente esperados. Não sei se me engano, mas quer-me parecer que já anda a humanidade um tanto enfastiada dos ovos de chocolate, ou porque são vendidos precocemente (mesmo antes do Carnaval estão disponíveis nos supermercados), ou se, devido ao barateamento do chocolate e maior variedade do produto (não discuto aqui a qualidade, isso é outra história), já não provocam o entusiasmo de outrora. Seja como for, continuam um símbolo da data, embora o menino ou menina que receber ovos de Páscoa dos pais, tios, avós, venha a ter chocolate à vontade por algumas semanas, sendo possível que comemore antes a existência de um ou dois dias sem aulas do que essa profusão meio enjoativa de doces. Entretanto, não se deixa de ouvir a criançada cantando "Coelhinho da Páscoa, que trazes pra mim"...
Agora, para que não digam que esta postagem está demasiado rabugenta: Tenho visto em muitas cidades os preparativos para representações da Paixão de Cristo e, independente de questões de caráter religioso, é interessante ver um bom número de jovens, amadores do teatro, nos últimos ensaios para as representações. Isso, no mínimo, torna a celebração mais participativa, mais democrática, o que já é bastante positivo. Concordam?
Cenário para a "Última Ceia", usado na representação da Paixão de Cristo em Jaguariúna - SP, na Páscoa de 2012 |
(*) ASSIS, J. M. Machado de. A Semana, 25 de março de 1894.
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