quarta-feira, 13 de agosto de 2014

A religiosidade nas civilizações do passado

Compreender as civilizações do passado não é coisa lá muito fácil. Pressupõe deixar de ver o mundo segundo a nossa lógica e tentar vê-lo, se é que tal coisa é possível, segundo os valores que norteavam os antigos.
Um exemplo é a questão do lugar ocupado pela religião. Hoje, na maior parte do Ocidente, religião é assunto pessoal. Cada um dá a ela a importância que julga adequada, o que pode ser, até, importância nenhuma. Igrejas que, há séculos, ficavam lotadas de fieis para as práticas de culto, hoje estão vazias, ou são transformadas em salas de concerto, lanchonetes, restaurantes, etc., etc., etc... E isso, é bom notar, quando são consideradas demasiado valiosas, historicamente. Caso contrário, são apenas postas abaixo. Em contrapartida, religiões midiáticas parecem ganhar um certo espaço.
Não era assim na Antiguidade. As práticas religiosas eram, essencialmente, o grande fator de agregação das comunidades, fossem elas grandes ou pequenas, muito ou pouco desenvolvidas. Estavam, além disso, associadas ao que pode ser visto como o nascer de algum tipo de sentimento nacional. Monarcas com fortes tendências a concentrar todos os poderes em si mesmos eram vistos ou como personificação de alguma divindade ou, o que não era pouco, como intermediários entre o povo e os deuses - eram, portanto, reis-sacerdotes.
Uma boa medida da importância que atribuíam às crenças religiosas pode ser dada pela qualidade do material que se empregava na construção de templos. Era sempre o melhor que se podia obter. Pedras, madeira, metais preciosos, nada se poupava quando a intenção era agradar aos deuses, obter, supostamente, o seu favor e, não menos significativo, dar uma demonstração da força, da devoção e da capacidade econômica, fosse de apenas uma povoação ou cidade, fosse de um império. Não é por acaso que, das ruínas que sobraram de antigas civilizações, grande parte é feita de templos.

Representação assíria de um templo (*)
É verdade que vários desses elementos prevaleceram através dos tempos. Muitos deles podem ser aplicados, quase sem restrições, à construção das grandes catedrais europeias na Idade Média. Países mais jovens, como é o caso do Brasil, passaram por algo parecido. O ouro das Gerais, no Século XVIII, produziu belíssimas igrejas de características barrocas; a riqueza gerada pela exportação de café possibilitou, no Século XIX ou mesmo no início do Século XX, a construção de igrejas importantes nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Mas, já nesse tempo, a religião começava a ser dissociada de questões cívicas. Grandes edifícios públicos foram também construídos, sem qualquer vínculo com assuntos ligados à religião predominante. Pelo contrário, por razões artísticas, não era incomum o recurso a temas provenientes da antiguidade greco-romana, ou seja, àquilo que se poderia chamar de "paganismo".
Posso imaginar que, depois destas considerações, alguns de meus leitores talvez pensem que, por uma variedade de motivos, alguns aspectos das antigas práticas associadas à religião estão, novamente, ganhando força, ao menos em alguns lugares. Sim, pode ser, e eis, portanto, um fenômeno que bem mereceria ser devidamente estudado.

(*) __________ The Buried City of the East - Nineveh. London: National Illustrated Library, 1851, p. 186.


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2 comentários:

  1. Marta, eu adoro lr tudo seu aqui.
    Estou na verdade lendo aos poucos essa
    matéria que muito me interessa
    e logo virei comentar, combinado?
    Linda quinta feira.
    Bjins
    CatiahoAlc./Reflexod'Alma

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    1. Venha quando quiser, será sempre bem-vinda. Tenha um ótimo dia.

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