terça-feira, 10 de abril de 2018

Como indígenas reagiam às tentativas de catequese por missionários jesuítas

De acordo com José de Moraes, jesuíta do Século XVIII, havia, como regra geral, três reações possíveis dos indígenas, quando missionários queriam catequizá-los:

1. Indígenas que recusavam a catequese


Não era incomum que o "não queremos" fosse declarado com agressividade. Alguns jesuítas foram mortos por grupos indígenas que recusaram a catequese. Às vezes, a recusa podia assumir um caráter até humorístico, como sucedeu com um índio que, para não ouvir a catequese, alegava ser surdo
Uma estratégia frequentemente adotada por jesuítas era enviar às aldeias não catequizadas alguns indígenas que já eram cristãos, devidamente instruídos para que dissessem viver muito bem em companhia dos padres. Então, na expressão de José de Moraes, "destas tão importantes práticas resultava comumente um de três efeitos: o primeiro, e o mais raro, era responderem com as armas na mão, que não querem nada com os brancos, porque sabem de certo que os hão de tratar muito mal e consumir no seu serviço". (¹)

2. Indígenas que disfarçavam o desinteresse pela catequese alegando que queriam pensar no assunto com mais tempo


Outra resposta possível, nas palavras do padre José de Moraes: "O segundo [modo de resposta] e menos usado é dizerem como os atenienses a São Paulo Audiemus te de hoc iterum (²), que é o mesmo que "considerarei no ponto mais devagar." (³)

3. Indígenas que recebiam bem os missionários e aceitavam o início da catequese


Atraídos pelas palavras dos já catequizados e por presentes (ferramentas, espelhos, pentes, agulhas, anzóis e outros pequenos objetos úteis), havia indígenas que recebiam bem os missionários. À medida que a expansão colonial prosseguia, a recepção favorável aos jesuítas passou a ter outro motivo: sob ameaça constante de escravização, ameríndios viam nos "padres da Companhia" sua única defesa, infelizmente menos eficaz do que seria desejável. Devotos de fachada, colonizadores também se faziam de surdos para não ouvir os padres, sempre que interesses econômicos estavam em jogo. A explicação de José de Moraes, quanto a uma recepção favorável, era esta:
"O terceiro e mais ordinário [modo de responder] é mandarem com os embaixadores (⁴) dois ou três índios dos mais capazes, que com a vista examinassem primeiro o que ouviram, e que significassem ao padre o grande gosto com que os seus nacionais ficavam de o verem nas suas terras. E quando já o industrioso missionário os via na sua presença, não é fácil explicar os carinhos e afagos que lhes fazia, e de tal sorte com regalos lhes ganhava os corações, que voltavam contentes e alegres a dizer maravilhas do padre, do bem que eram tratados os índios nas suas aldeias, a quem não faltavam com o necessário, e acudiam com mais ainda do preciso; e para que o gosto de todos ficasse de todo completo, levavam já a certeza de quando o padre os havia de ir visitar, passadas tantas luas, que é o método por onde regula este gentio a sucessiva distribuição e número certo dos tempos, o algarismo dos meses e a numerosa idade dos dias." (⁵)

Escrevendo em meados do Século XVIII, José de Moraes podia, já, buscar uma sistematização dos fatos relacionados à catequese jesuítica nos dois séculos precedentes. Sua retrospectiva foi, no entanto, assinalada por um caráter apologético, que nada tinha de gratuito. A Companhia de Jesus passava por dias turbulentos, nos quais, sob o governo do Marquês de Pombal, a Ordem seria expulsa de Portugal e de seus domínios, pondo fim à catequese que empreendera no Brasil Colonial.

(1) MORAES, José de S.J. História da Companhia de Jesus na Extinta Província do Maranhão e Pará. Rio de Janeiro: Typographia do Commercio, 1860, p. 94.
(2) Cf. Actus Apostulorum 17, 32.
(3) MORAES, José de S.J. Op. cit., p. 94.
(4) Referência aos indígenas que os missionários haviam mandado à aldeia.
(5) MORAES, José de S.J. Op. cit., pp. 94 e 95.


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