quinta-feira, 19 de abril de 2018

O sumiço (definitivo) de Rômulo

Rômulo, segundo a tradição que se reputa lendária, teria, ao lado de seu irmão Remo, fundado em 753 a.C. a cidade de Roma. Já expliquei aqui no blog que, no estágio atual dos conhecimentos, entende-se que Roma, enquanto uma aldeia de pastores, existia muito antes disso (por volta do ano 1000 a.C.). Mas, se alguém de vocês, leitores, imagina que seja possível resolver o impasse na eventualidade de que alguma escavação arqueológica descubra o túmulo de Rômulo, será melhor esquecer a ideia: digo isso porque tal monumento (¹) jamais existiu, de acordo com registros feitos tanto por Tito Lívio (²) como por Aneu Floro (³). Passemos, portanto, às fontes.
Tito Lívio conta que Rômulo simplesmente desapareceu durante uma tempestade monstruosa e seu corpo jamais foi encontrado; a partir disso, "começaram a saudá-lo como um deus, nascido de um deus (Marte), rei e pai da cidade romana". (⁴) Quanto a Floro, vai além, explicando que "a tempestade repentina e o eclipse solar (⁵) constituíram uma espécie de  consagração" (⁶), para que Rômulo viesse a ser considerado uma divindade menor. 
Sucede, leitores, que nem Tito Lívio e nem Floro, que referiram a existência de Rômulo como uma personalidade real, parecem ter acreditado muito neste epílogo algo romântico, uma vez que ambos sugerem a hipótese de que os senadores de Roma teriam feito o suposto filho de Marte em pedaços, de modo que o sumiço durante a tempestade e posterior divinização seriam apenas a versão propalada para encobrir um crime horrendo. Floro teve ainda o cuidado de citar o motivo para o assassinato: Rômulo seria um sujeito de temperamento muito difícil, a quem os senadores já não suportavam mais. Afinal, tudo combina muito bem com a fama dos romanos de tão remotos dias.

(1) No sentido latino do termo.
(2) 59 a.C. - 17 d.C.
(3) Contemporâneo do imperador Adriano.
(4) Ab urbe condita libri.
(5) Ocorrido pouco depois do "sumiço".
(6) Epitome Rerum Romanarum; os trechos citados de Tito Lívio e Floro foram traduzidos por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.


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