segunda-feira, 23 de setembro de 2024

Como era feito o contrabando de ouro e diamantes

Extração de diamantes no Brasil (¹)

Muitos mineradores, e mesmo simples faiscadores de ouro do Século XVIII achavam que a cobrança dos "reais quintos" não passava de exploração. Afinal, eram eles que arrancavam o ouro da terra, à sua custa e à custa do suor de seus escravos, e ainda tinham que pagar um imposto extorsivo? A ideia de que o rei era "senhor natural" do território que governava e que, por sua muita bondade, fazia aos súditos a concessão para que explorassem o ouro não era nada popular no Brasil, e continuou a desfrutar de idêntica antipatia no Século XIX, mesmo com a distinta presença da Corte no Rio de Janeiro.
Em consequência, o contrabando de ouro e diamantes era enorme. A criatividade dos contrabandistas não conhecia limites. O barão de Eschwege (²) descreveu, em Pluto Brasiliensis, algumas das "técnicas" de contrabando, em particular quando era necessário passar por algum registro, que era um ponto de controle de carga e bagagem entre uma capitania e outra: 
"A fim de passar a salvo, usa de toda espécie de espertezas, já bastante conhecidas: caixas com fundo falso, sacos de couro cozidos nas almofadas das cangalhas, esconderijos de madeira nas canastras e fardos de algodão, apesar de estes poderem ser revistados por meio de uma agulha de ferro, que se atravessa em todas as direções. Um deles, quando conduzia uma boiada, teve a ideia de atar saquinhos com ouro na cauda de bois mansos.
Os diamantes eram também escondidos nas bengalas e nos cabos ocos dos chicotes, na coronha das espingardas ou das pistolas, no próprio cano das mesmas, ou no salto das botas." (³)
Eschwege escrevia sobre o que tinha visto, mas devia, também, ter ouvido muitas histórias. É impossível que houvesse presenciado tudo isso porque, afinal, viera ao Brasil a convite do governo joanino. Não era um funcionário público, mas não era, também, alguém em quem contrabandistas iriam facilmente confiar. Fica, porém, uma questão: se as artimanhas dos contrabandistas eram fartamente conhecidas, por que ainda eram usadas? Pode-se imaginar perfeitamente quanta corrupção acontecia nos registros, sem falar no aborrecimento dos funcionários que, dia a dia, precisavam fiscalizar cada caravana, cada tropa de mulas, cada grupo de viajantes que passava, monotonamente, no passo preguiçoso ou cansado de homens e animais. Como regra, não deviam achar razoável que as filas de verificação se tornassem demasiadamente longas. 

(1) SPIX, Johann B. von et MARTIUS, Carl F. P. von. Atlas zur Reise in Brasilien. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog. 
(2) Wilhelm Ludwig von Eschwege (1777 - 1855), especialista em minas, esteve no Brasil a convite do governo joanino, que pretendia reanimar a extração de minerais preciosos no país. 
(3) ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Pluto Brasiliensis, trad. Domício de Figueiredo Murta. Brasília: Senado Federal, 2011, p. 525.


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