terça-feira, 15 de janeiro de 2019

Por que animais eram cultuados no Egito Antigo

Deuses egípcios eram frequentemente representados com cabeça de animal e corpo humano. Toth (¹), por exemplo, tinha cabeça de íbis, Anubis tinha cabeça de chacal, Horus tinha cabeça de falcão e Hathor era, nem mais e nem menos, que a deusa de cabeça de vaca. Chama-se a isto antropozoomorfismo. Letras demais? Talvez, mas o significado é simples: representação de um deus ou deusa com corpo parcialmente humano e parcialmente animal. É só.
Horus, aqui representado
com cabeça de falcão (³)
A explicação mais plausível para tal fenômeno não é a de que todo e qualquer animal de determinadas espécies era considerado sagrado, e sim de que os deuses, que tinham a mania de bisbilhotar o que acontecia mundo afora, às vezes faziam visitas aos humanos disfarçados de animais. O resultado dessa ideia é que, não sabendo quando animais eram ou não a encarnação de alguma deidade, ficavam todos sob interdito, para evitar que, por tenebroso equívoco, alguém, pensando acertar em uma caça para o jantar, acabasse matando um deus. 
Para os animais envolvidos na questão, a vida podia ser muito boa. Paparicados por sacerdotes e respeitados pela gente comum, contavam ainda com a proteção de leis que puniam severamente quem atentasse contra eles. Heródoto, que esteve no Egito no Século V a.C., afirmou que, em certos casos, quem matasse um animal considerado sagrado pagava com a vida tamanha perfídia: "É grande infelicidade para um egípcio matar intencionalmente algum desses animais [sagrados], porque a pena para isso é a morte; os sacerdotes arbitram uma multa para quem mata um animal acidentalmente. Entretanto tirar a vida, deliberadamente ou não, de um íbis ou falcão, tem sempre como punição a pena capital." (²) 
O íbis, como já foi dito, poderia ser Toth, e, quanto ao falcão, como assegurar que não fosse Horus? Uma flechada, e lá iria o deus para o espaço - ou melhor, para além do poente, onde ficava o "país de paz perfeita", morada dos mortos bem-comportados. Matá-lo não seria, então, fazer-lhe um favor? Como muitas outras, essa mitologia tinha lá suas contradições.

(1) Buscando alguma uniformidade, adotei nesta postagem a grafia de maior aceitação internacionalmente. Em português também são usuais Tot, Anúbis, Hórus e Hator.
(2) HERÓDOTO. Histórias. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
(3) BUDGE, E. A. Wallis. The Gods of The Egyptians vol. 1. London: Methuen & Co., 1904. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.


Veja também:

2 comentários:

  1. Grande parte da sua beleza reside nas suas contradições, não acha? Tenho um vaso com cabeça de Anubis em casa, lembrança da minha lua-de-mel ao Egito. É das peças que mais gosto
    Abraço, uma linda semana
    Ruthia

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    Respostas
    1. Sim, concordo. A humanidade está repleta de contradições. Portanto, se bem ou se mal, não é só do Egito Antigo. Tenha uma ótima semana (já está quase no fim rsrsrssssssss).

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