terça-feira, 10 de agosto de 2021

Náufragos


As ondas arremessam homens contra a areia. Desde que uma tempestade resultara em grandes avarias, o navio estava condenado. O piloto, mestre experiente nas armadilhas do mar, tratara de conduzir a embarcação para perto de terra. O risco, no entanto, era enorme. A traição de um rochedo submerso se encarregara da sentença final. 
As vagas são ferozes e mesmo bons nadadores têm consciência do perigo. Nadar, boiar, voltar a nadar, ainda quando as forças se esgotam. Sobreviver não é para os fracos.
Que lugar será esse? Ilha, talvez? Terra firme? Estirados na praia, ressentem-se da confusão mental resultante de tanto esforço. Entreolham-se. Contam-se. São onze, ao todo. Onde estarão os outros? 
Um estrondo, olham na direção do mar e veem, à distância, o que restara do casco tomar o rumo das profundezas. A quase alegria que a sensação de chegar à areia trouxera é substituída, em um átimo, pelo mais profundo desânimo. O olhar se perde no horizonte.
Mais tarde, o calor do sol, que seca as roupas, aliado à sede e à fome, os traz de volta à realidade. Alguns, sentados na areia, se entreolham, em uma interrogação que se expressa no silêncio. Três caminham perto da arrebentação, deixando pegadas que as ondas logo se encarregam de cobrir. 
A escassez de palavras é quebrada por dois veteranos de outro naufrágio, que tratam de tomar a liderança. É preciso que se dividam em grupos: um, que permanecerá na praia, tentando recuperar objetos do navio arrastados pelas águas e que possam ser úteis, e outro, que irá à procura de água potável e comida. Ao primeiro ficará a tarefa de providenciar alguma sinalização. Se tiverem sorte, ao passar por ali outro navio, os marujos notarão uma cruz rústica contrastando com a areia tão alva, ou a bandeira improvisada com uma camisa que, para isso, se rasgou. Talvez, então, sejam resgatados.  
Além da linha da praia, em meio à vegetação exuberante, alguns pares de olhos negros observam todos os movimentos dos recém-chegados.


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