Depois de semanas ou meses no mar, os colonizadores finalmente chegavam às terras do Brasil. O que os esperava? Certamente não uma boa acolhida em uma estalagem confortável (lembre-se, era o século XVI) e, dependendo da localidade e da ocasião, não havia nem mesmo um teto sob o qual descansarem. A embarcação, para que não encalhasse, ficava a uma boa distância no mar, enquanto os novos colonos eram levados à praia em batéis. Com sorte, encontrariam água, frutos e caça. As primeiras povoações demoraram a desenvolver-se e, por isso, quem vinha ao Brasil, fosse de livre vontade ou em virtude de uma sentença de degredo, já sabia que os primeiros tempos seriam muito difíceis.
Se, em lugar de um desembarque, a chegada à costa era consequência de um naufrágio, a situação podia ser ainda pior. O colono que desembarcava podia trazer consigo alguns pertences, ferramentas e mesmo alguns suprimentos; já os náufragos, estavam longe de ter essa possibilidade, ainda que, em alguns casos, conseguissem salvar alguma coisa da embarcação perdida.
Temos, a respeito, o testemunho de Hans Staden (¹) e, como ele, muitos outros que não eram portugueses devem ter vindo parar na costa da América (²). Conta-nos que, estando em uma embarcação espanhola para a qual fora contratado como artilheiro, chegaram, segundo registro do piloto, a 28º Sul, o que nos indica estarem no litoral de Santa Catarina, tendo desembarcado em uma ilha (seria a de mesmo nome?). Ali, depois de fazerem fogo, derrubaram uma palmeira, da qual tiraram o palmito, que era uma novidade para muitos europeus e do qual, nos registros da época, encontramos descrições atribuindo-lhe os mais variados sabores.
A situação desses navegantes, entretanto, piorou, de modo que, nos cerca de dois anos e meio que ali permaneceram, foram obrigados a alimentar-se de coisas que lhes pareciam abomináveis: ratos silvestres, lagartos, mariscos, enfim, aquilo que encontravam, mesmo porque, ainda segundo o relato de Hans Staden, os índios, que inicialmente tinham "cooperado", deixaram de fazê-lo e desapareceram quando as poucas mercadorias que tinham para escambo acabaram. Melhor situação encontraram em outra ilha onde havia uma grande colônia de alcatrazes que, conta-nos, eram fáceis de capturar. Com isso, tiveram carne e ovos.
Finalmente, conseguiram sair dali, mas naufragaram próximo a São Vicente e o nosso informante acabou contratado para trabalhar na defesa da área ocupada por portugueses, fato que lhe resultaria em terríveis problemas, ao ser capturado por tupinambás. Mas é desse tempo no qual serviu na fortaleza lusitana que deixou uma informação que muito nos interessa, por dar uma ideia do que cabia aos recém-chegados colonizadores em termos de alimentação. Mencionando ter um escravo carijó que lhe trazia caça, Staden conta que, no Brasil, não havia muito mais alimento senão aquilo que se achava no mato. É fácil compreender que o confronto permanente com os nativos dificultava, senão impedia completamente, o estabelecimento de lavouras que, afinal, nem poderiam mesmo ser muito extensas, na estreita faixa de terra existente entre o Oceano Atlântico e a Serra do Mar.
(1) STADEN, Hans. Zwei Reisen nach Brasilien. Marburg: 1557.
(2) Sobre isso, veja a postagem "Grandes navegadores - Parte III: Uma aventura para valentes de diversas origens".
Veja também:
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