quarta-feira, 22 de julho de 2015

Equipamento básico de viagem no Brasil do Século XIX

O que é que não pode faltar em sua mala ou mochila para uma viagem? Pense um pouco e compare com o que seria preciso levar se vivesse no Século XIX.

Liteira para viagens, Século XIX, construída em madeira e couro (¹)
Viajar pelo Brasil, antes da existência de ferrovias, era coisa que pouca gente fazia. As dificuldades eram enormes. Supondo que a viagem fosse terrestre, era preciso considerar que as distâncias deviam ser cobertas em lombo de animais, e, às vezes, a pé. Sim, havia quem viajasse em liteira, e até em rede. Nesse caso, seria indispensável ter escravos carregadores, embora algumas liteiras pudessem ser carregadas por animais. Eram poucas as estradas, e as que recebiam esse nome não passavam, como regra geral, de caminhos péssimos, repletos de buracos. Eventualmente era necessário atravessar trechos de mata, nos quais toda a confiança devia ser depositada nos conhecimentos de um guia experiente. Mas, se o guia cometesse um erro, os resultados podiam ser desastrosos. 
Hotéis, ao longo do caminho, simplesmente não existiam. Em alguns lugares havia os quase sempre imundos pousos de tropeiros, ou, com sorte, seria possível encontrar abrigo em casa de alguma família. Senão, era preciso acampar, sobre terreno nem sempre favorável.
Tendo andado pelo interior do Brasil um pouco depois da Independência, o Brigadeiro Raimundo José da Cunha Matos deixou um livro de apontamentos de viagem, cujo propósito era auxiliar àqueles que, depois dele, tivessem de enfrentar dificuldades semelhantes às que encontrara. Nessa obra teve o cuidado de anotar sugestões quanto àquilo que considerava ser o equipamento básico para a viagem de um "indivíduo abastado". Sigamos com ele:
"Um toldo ou barraca de brim; cama de campanha com armação de oleado; mesa elástica; uma cantina com um terno de quatro ou seis caçarolas, que tenham malhete para se introduzir o cabo, e possam acomodar-se umas dentro das outras; uma terrina redonda de folha de Flandres dobrada, dentro da qual se acomodem os pratos de folha de sopa e guardanapos; chaleira de ferro, bule, xícaras, pires, facas, colheres e garfos [...]." (²)
A lista incluía, ainda, castiçais, velas e, naturalmente, alimentos. Vê-se, portanto, que não era nada que um homem pudesse carregar sozinho. O tal "indivíduo abastado", para retomar a expressão usada por Cunha Matos, precisaria dispor de vários animais de carga, escravos e/ou tropeiros assalariados e, por suposto, de um guia tarimbado. Além de perigosas e cansativas, as viagens nessa época eram, já se nota, bastante dispendiosas. Correr mundo, como turismo, era coisa que passava pela cabeça de muito pouca gente.

(1) A liteira fotografada para esta postagem pertence ao acervo do Museu Histórico de Itapira - SP.
(2) MATOS, Raimundo José da Cunha. Itinerário do Rio de Janeiro ao Pará e Maranhão Pelas Províncias de Minas Gerais e Goiás. Rio de Janeiro: Typ. Imperial e Constitucional, 1836, p. 18.


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