segunda-feira, 6 de julho de 2015

Quando a fome quase arruinou Roma

Os antigos romanos eram muito supersticiosos. Sim, ainda há muita gente que é, até hoje, mas entre eles a coisa tomava forma de religião institucionalizada. Mantinham um colegiado de prognosticadores (áugures), que executavam o trabalho seguindo métodos bem estranhos, como examinar, por exemplo, as vísceras de animais que eram sacrificados.
Pois bem, é Tácito quem conta, nos Annales, que o ano 805 da fundação de Roma (*)  assinalou-se por uma série de eventos prodigiosos, que foram considerados desfavoráveis pelos "especialistas": aves de mau presságio foram vistas voando e pousando sobre o Capitólio, sucessivos tremores de terra resultaram no desabamento de muitas casas e, para cúmulo de todo isso, as colheitas foram muito ruins, sendo seguidas de grande fome, o que, ainda segundo Tácito, também foi considerado um prodígio. Poderia ser de outra forma? 
A situação tornou-se tão grave que o próprio imperador Cláudio, em uma ocasião em que dava audiência no tribunal, foi assediado pela multidão faminta, e só conseguiu sair de lá com o uso da força por parte de sua guarda pessoal. 
Roma, a grande Roma Imperial, estava à beira do caos. Só restava alguma comida para mais uma quinzena.
Porém... magnaque deum benignitate et modestia hiemis rebus extremus subventum... Os romanos acabaram salvos "da miséria extrema pela grande bondade dos deuses e pelo inverno moderado". Na prática, um inverno menos rigoroso possibilitou que não se interrompessem de todo as navegações para o Egito, de modo que generosos suprimentos de trigo foram embarcados e, atravessando o Mediterrâneo, chegaram à Península Itálica e salvaram Roma.
Tácito conclui suas considerações sobre o malfadado ano com uma crítica aguda à administração do Império. Sendo a Itália tão fértil como sempre fora, os romanos preferiam fazer de províncias distantes no norte da África o seu celeiro; podiam ter tão perto a subsistência, mas entregavam-se, afinal, à sorte e às condições de navegação.

(*) 52 d. C.


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