quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

A celebração do Natal por missionários jesuítas e indígenas catequizados em São Paulo de Piratininga

Os jesuítas, a despeito de métodos inovadores que eventualmente empregavam na catequese, procuravam conformar os catecúmenos às práticas da Igreja quanto ao calendário litúrgico e à administração dos sacramentos. É o que se nota em uma carta escrita em São Paulo de Piratininga por José de Anchieta, em fins de dezembro de 1556, na qual descrevia práticas associadas à celebração do Natal:
"Antes do dia do Nascimento do Senhor procuramos que [os indígenas] se confessassem, o qual fizeram muitas mulheres e alguns homens, os quais diligentemente examinamos nas coisas da fé, e o que principalmente pretendemos é que saibam o que toca aos artigos da fé, scilicet ao conhecimento da Santíssima Trindade e aos mistérios da vida de Cristo que a Igreja celebra, e que saibam, quando lhes for perguntado, dar conta destas coisas [...]." (¹)
Anchieta diria ainda:
"Neste mesmo tempo do Nascimento do Senhor se confessaram e comungaram muitas mulheres mestiças com muita devoção, o qual em outros tempos muitas vezes fazem." (²)
O que se pode observar é que a catequese não ficava restrita aos indígenas, mas tinha também como objetivo, tanto quanto fosse possível, alcançar o restante da população da aldeia de Piratininga, como se vê pela referência a "mulheres mestiças", ainda que nem sempre os colonizadores estivessem dispostos a dar atenção aos padres da Companhia (³). Em todo caso, era mais frequente que, dentre a população livre, as mulheres se mostrassem mais devotas, embora os homens, até por obrigação social, não deixassem de comparecer aos ofícios religiosos em ocasiões de maior importância. Também quanto à menção de Anchieta relativamente às "mulheres mestiças", será útil recordar que eram poucas, ou melhor, pouquíssimas as mulheres que, nesse tempo, vinham do Reino para viver no Brasil, de modo que não era incomum que colonos portugueses em Piratininga se casassem com índias, nem sempre sob as leis da Igreja. Desses casamentos nasciam os chamados mamelucos, que, nos primeiros séculos de São Paulo, viriam a ser a maioria da população.

(1) ANCHIETA, Pe. Joseph de, S.J. Cartas, Informações, Fragmentos Históricos e Sermões. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1933, p. 93.
(2) ANCHIETA, Pe. Joseph de, S.J. Op. cit., p. 94.
(3) Não eram incomuns os atritos entre padres e colonizadores, tendo por principal razão as objeções que os jesuítas faziam à escravização de indígenas.


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