quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Ônibus puxados por burros

Carruagens, seges, coches e outros veículos de tração animal podiam transportar poucas pessoas. Cidades grandes precisavam, mesmo no Século XIX, de algum tipo de transporte coletivo. O Rio de Janeiro, por exemplo, capital do Império do Brasil, teve um sistema de ônibus puxados por burros.
Como era isso?
Temos um bom relato, deixado pelo pastor e missionário metodista Daniel P. Kidder, americano que residiu em território brasileiro entre 1837 e 1840. Seu testemunho chega a ser surpreendente e, como se verá, apresenta algum contraste com a realidade do transporte coletivo urbano no Brasil de hoje:
"Mais ou menos por essa época uma companhia de ônibus iniciou o serviço de transporte coletivo por meio de carros, entre a Praça da Constituição - ponto central da cidade - e os bairros das Laranjeiras e Botafogo, de um lado, e, de outro, São Cristóvão e o Engenho Velho. Nenhum outro serviço semelhante havia sido até então inaugurado em qualquer outra cidade do país. Os belos carros construídos especialmente para esse fim eram tirados por quatro mulas e apresentavam aspecto quase tão interessante como os que correm pela Broadway." (¹)
Depois de assinalar que um ponto desfavorável é que o número de veículos era pequeno para a quantidade de passageiros em potencial (que novidade!), Kidder afirma que a população tinha, dentro dos ônibus, uma conduta excelente:
"As pessoas habituadas ao ar indiferente dos passageiros de semelhantes carruagens, em Nova Iorque, surpreender-se-iam ao ver a amabilidade e a polidez com que, no Rio, se tratavam nos ônibus pessoas inteiramente estranhas." (²)
Estão surpresos, senhores leitores?!!!
Vindo dos Estados Unidos onde, naqueles dias, também havia trabalho escravo, Daniel Kidder ainda afirmaria:
"Outra coisa surpreendente é que a ninguém se nega ingresso por causa da cor." (³)
Cabe aqui uma explicação. Nenhum negro livre era impedido de usar os ônibus, mas escravos não podiam fazê-lo, havendo apenas exceção para amas que acompanhavam as respectivas senhoras. Não era a cor da pele, portanto, o fator de discriminação, e sim a condição social.

(1) KIDDER, Daniel P. Reminiscências de Viagens e Permanência no Brasil. 
Brasília: Senado Federal, 2001, p. 142.
(2) Ibid.
(3) Ibid.


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