Os desterrados que ajudaram a povoar a colônia portuguesa na América
De acordo com o Padre Simão de Vasconcelos, ao vir ao Brasil, o primeiro governador-geral, Tomé de Sousa, trouxe consigo, entre outras pessoas, seiscentos soldados e, nada mais, nada menos, que qua-tro-cen-tos condenados ao degredo, ou seja, desterro:
"Constava o grosso da gente de mil homens, os seiscentos soldados, os quatrocentos degradados, afora outros muitos moradores com suas casas, e alguns criados de El-Rei, que vinham providos em ofícios". (¹)
Faz-se quase desnecessária a recordação de que essa não foi a única leva de desterrados que veio ao Brasil. Aliás, a coisa começou antes: na expedição de Cabral vieram dois, que, segundo Caminha, participaram muito devotamente da segunda missa celebrada por Frei Henrique de Coimbra. O motivo, naturalmente, devia ser o fato de que não sabiam se teriam ocasião para alguma outra. Depois desses dois "pioneiros" vieram muitos e muitos outros, nos centênios subsequentes.
Ora, que gente era essa que, contra a vontade (supõe-se) acabava tendo de embarcar para a Colônia?
Não pretendo dar aqui uma listagem exaustiva, apenas menciono alguns casos em que a sentença, segundo as Ordenações do Reino (²) deveria ser degredo temporário ou vitalício para o Brasil (que, diga-se de passagem, era, na época, pena mais severa que o degredo para as colônias em solo africano: como regra geral, um ano no Brasil equivalia a dois anos na África). Estipulava a lei, também, que o degredo no Brasil nunca seria inferior a cinco anos. Vejamos, pois, senhores leitores:
- Dez anos no Brasil para o carcereiro que tivesse "ato desonesto" com presa, com o consentimento dela (sendo não-consentido, atribuía-se pena de morte);
"Constava o grosso da gente de mil homens, os seiscentos soldados, os quatrocentos degradados, afora outros muitos moradores com suas casas, e alguns criados de El-Rei, que vinham providos em ofícios". (¹)
Faz-se quase desnecessária a recordação de que essa não foi a única leva de desterrados que veio ao Brasil. Aliás, a coisa começou antes: na expedição de Cabral vieram dois, que, segundo Caminha, participaram muito devotamente da segunda missa celebrada por Frei Henrique de Coimbra. O motivo, naturalmente, devia ser o fato de que não sabiam se teriam ocasião para alguma outra. Depois desses dois "pioneiros" vieram muitos e muitos outros, nos centênios subsequentes.
Ora, que gente era essa que, contra a vontade (supõe-se) acabava tendo de embarcar para a Colônia?
Não pretendo dar aqui uma listagem exaustiva, apenas menciono alguns casos em que a sentença, segundo as Ordenações do Reino (²) deveria ser degredo temporário ou vitalício para o Brasil (que, diga-se de passagem, era, na época, pena mais severa que o degredo para as colônias em solo africano: como regra geral, um ano no Brasil equivalia a dois anos na África). Estipulava a lei, também, que o degredo no Brasil nunca seria inferior a cinco anos. Vejamos, pois, senhores leitores:
- Dez anos no Brasil para o carcereiro que tivesse "ato desonesto" com presa, com o consentimento dela (sendo não-consentido, atribuía-se pena de morte);
- Degredo perpétuo para procuradores de justiça que fizessem algum tipo de movimento, pressão ou acordo para elevação de seus salários;
- Dez anos de degredo para "escrivães relapsos";
- Dez anos para aquele que, praticando a mineração no Reino, não encaminhasse o ouro encontrado para fundição;
- Degredo e multa para "adivinhos" (astrólogos, todavia, não eram incluídos, já que, nesses tempos, a astrologia ainda era vista como uma ciência);
- Degredo perpétuo para usuários de pequenas quantidades de moeda falsa;
- Também degredo perpétuo para quem reduzisse o metal precioso de moedas de pouco valor;
- Degredo perpétuo para homens de alta posição social que retirassem freiras de algum convento;
- Degredo perpétuo para adúltero, quando a adúltera fosse perdoada pelo marido traído (não havendo perdão, ambos os adúlteros seriam executados);
- Degredo para a amante reincidente de algum religioso;
- Degredo e açoites para freira alcovitada;
- Degredo, finalmente, para ladrões de bolsas (devia ser das causas mais comuns que "trazia" gente ao Brasil).
As Ordenações do Reino determinavam que, ao sair um navio de Lisboa para o Brasil, devia seu comandante informa-se se havia condenados a levar. Nos primeiros tempos coloniais as viagens não eram muito frequentes e, portanto, essa determinação tinha por objetivo assegurar que os sentenciados deixassem a prisão e passassem efetivamente ao cumprimento das respectivas penas o mais cedo possível. Para prevenir fugas, os prisioneiros faziam a viagem tendo cadeia no pé ou colar de ferro no pescoço.
Resta observar que, toda essa gente altamente qualificada (³) acabou, para bem ou para mal, fazendo parte da massa de colonizadores. Fica para outro dia a discussão das consequências práticas de tal fato, embora os leitores deste blog bem possam fazer algum uso da imaginação, tirando conclusões por si mesmos.
(1) VASCONCELOS, Pe. Simão de S.J. Crônica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil vol. 1, 2ª ed. Lisboa: Fernandes Lopes, 1865, p. 28.
(2) De acordo com a edição de 1824 da Universidade de Coimbra.
(3) Padres e governantes da Colônia não demorariam em fazer chegar ao Reino veementes protestos contra o envio sistemático de sentenciados a degredo, informando que eram responsáveis por corromper a população nativa que se procurava catequizar, bem como por inúmeras outras desordens.
Veja também:
E imaginação não nos falta!! Gostei muito do "degredo e açoites para freiras alcoviteiras" e chocada com o dos procuradores de justiça que quisessem aumento de salário?! O restante é mais ou menos o que se espera, ao espírito da época claro.
ResponderExcluirAbraço
Ruthia d'O Berço do Mundo
Ao contrário do que muitos pensam, questões trabalhistas não apareceram apenas no Século XIX. Existiam muito antes. Ninguém iria perder tempo proibindo aquilo que não acontecia.
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