quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Jabuticabas e jabuticabeiras


Jabuticabas bem maduras, doces, são ótimas. A frutinha, que é encontrada junto ao tronco da árvore que a produz, encantou os colonizadores e, já no Século XIX, buscando sistematizar informações históricas e geográficas sobre o Brasil, o Padre Ayres de Casal observou:
"A jabuticabeira é árvore pequena, delgada e de casca lisa; as folhas, que são envernizadas por ambas as bandas, mas não de um mesmo verde, variam de forma num mesmo ramo; só floresce no tronco, começando do chão até onde os ramos têm boa grossura; [...] é fruta gostosa e inocente: dela se destila um licor forte." (¹)
Deixemos de lado quaisquer considerações sobre o último falar de Ayres de Casal...
Em meados do Século XIX, o jovem Império do Brasil, ainda coberto por densas florestas, despertava uma certa curiosidade, atraindo a visita de estrangeiros que, entre suas observações, sempre relatavam as frutas da terra que haviam tido ocasião de apreciar. O príncipe Adalberto, que percorreu terras brasileiras nos anos quarenta do Século XIX, contou:
"Paramos então por um momento debaixo de uma árvore da qual fizemos cair, sacudindo-a, uma grande quantidade de jabuticabas, uma fruta muito parecida com a nossa cereja preta, que nos refrescou agradavelmente." (²)
Esse príncipe prussiano deve ter realizado um sonho de menino ao andar pela América do Sul; no entanto, não sei de onde tirou a ideia de que jabuticabas são semelhantes a cerejas pretas. É provável que não lhe ocorresse, ao escrever, nenhuma outra comparação que pudesse dar a seus leitores uma ideia exata do que eram as jabuticabas.
Não muito feliz, também, foi a comparação feita por Daniel P. Kidder, pastor e missionário metodista, nascido nos Estados Unidos, que residiu no Brasil durante o Período Regencial:
"Essa árvore pertence à ordem das mirtáceas e é dotada da grande singularidade de dar as flores e os frutos diretamente colados ao tronco e aos galhos principais enquanto que as extremidades são cobertas por densa folhagem verde. A fruta é deliciosíssima, e dá a ideia de uma grande uva roxa." (³)
"Grande uva roxa"? Muito estranho. Talvez o príncipe Adalberto e o missionário Kidder só tenham acertado mesmo no formato, o que, convenhamos, não era tão complicado. Mas, se queremos ser justos com eles, havemos de admitir que a tarefa não era fácil. Quem é que nunca se viu sem palavras ao tentar descrever a outra pessoa uma fruta ou mesmo uma especialidade culinária pouco conhecida?

(1) CASAL, Manuel Ayres de. Corografia Brasílica, vol. 1. 
Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1817, pp. 97 e 98.
(2) ADALBERTO, Príncipe da Prússia. Brasil: Amazônia - Xingu. Brasília: Senado Federal, 2002, p. 145.
(3) KIDDER, Daniel P. Reminiscências de Viagens e Permanência no Brasil. Brasília: Senado Federal, 2001, p. 216.


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2 comentários:

  1. Verdade, Marta. Também não saberia descrever a jabuticaba. Que saudades das vossas frutas, especialmente os maracujás grandes e as goiabas brancas. Já o meu marido daria muito por uma boa tigela de açaí....
    Beijinhos
    Ruthia d'O Berço do Mundo

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