Sabe o que é pelota? No sentido a ser usado nesta postagem, poderia ser definida como uma embarcação improvisada, feita geralmente de couro de boi. Quem a descreve com mais detalhes é Saint-Hilaire, que precisou servir-se de uma ao passar de uma margem a outra do rio Butuí. Ele é quem conta, com uma pitada de humor, a despeito da rabugice habitual:
"Ao nascer do dia, começamos a descarregar a carroça, e minhas bagagens passaram para uma piroga improvisada, tão em uso na Capitania de Montevidéu e de Rio Grande, onde não há ponte.
A pelota, nome dado a estas pirogas, é simplesmente um couro cru ligado nas quatro pontas e que, desse modo, forma um barco que se pode confundir, pela aparência, com as sacolas de papel onde se põem biscoitos. Enche-se a pelota de objetos, ata-se nela uma corda ou tira de couro; um homem, a nado, prende a corda entre os dentes e faz passar assim a piroga. Para facilitar o trabalho, meus homens estenderam uma corda de um lado a outro do rio, com a intenção de ajudá-los na travessia a nado. Eu mesmo atravessei o rio sentado numa pelota e cheguei felizmente à outra margem, bem como as minhas bagagens e a carroça. Matias, José Mariano e Firmiano ajudaram, alternadamente, a pelota a passar." (¹)
Um fato interessante é que Debret também deixou um registro desse tipo de embarcação, não em palavras, mas em uma bela imagem, que pode ser vista abaixo.
Embarcação feita com couro de boi, de acordo com Debret (²) |
Tanto Saint-Hilaire quanto Debret estiveram no Brasil quando o período colonial se encerrava, e o país estreava como nação independente. Nesse tempo, a pelota tinha uso em muitos lugares, já que permitia que rios sem pontes fossem atravessados por viajantes. Era uma embarcação compatível com as condições muitas vezes difíceis do povoamento da América do Sul - os transportes, por qualquer método então disponível, eram precários, e as viagens, muito perigosas. Quem tinha de percorrer distâncias consideráveis devia arriscar-se pelas péssimas trilhas existentes (quando existiam...) submetendo-se às condições abjetas que reinavam na maior parte dos pousos de tropeiros, quase os únicos lugares em que era possível aos viajantes encontrar abrigo à noite ou em caso de tempestades.
(1) SAINT-HILAIRE, A. Viagem ao Rio Grande do Sul. Brasília: Senado Federal, 2002, p. 327.
(2) DEBRET, J. B. Voyage Pittoresque et Historique au Brésil vol. 2. Paris: Firmin Didot Frères, 1835. O original pertence à Brasiliana USP; a imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.
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