Formiga-cortadeira em ação |
Combatentes fortes, coesos, dispostos ao sacrifício quando necessário. Um dos mais poderosos exércitos da Terra. Sobre-humanos? Não, formigas!
Dizia-se, nos tempos coloniais, que a formiga era "o rei do Brasil". Tinham os colonizadores de tratar com esse terrível inseto, se quisessem roças produtivas, ainda que fossem de mandioca, uma planta nativa do Continente Americano, que muitos povos indígenas do Brasil conheciam e cultivavam com sucesso.
A questão que se colocava, ainda no Século XVI, era a do combate eficaz aos formigueiros e, em particular, às chamadas "formigas-cortadeiras", capazes de, em uma só noite, transformar uma plantação verdejante em um amontoado de caules em plena orfandade de folhas.
Como quase tudo na época, os métodos de combate usados pelos agricultores eram em extremo rudimentares. Segundo Gabriel Soares, que foi senhor de engenho na Bahia, eram estes os procedimentos:
"[...] Para se defenderem as roças desta praga da formiga, buscam-lhe os formigueiros donde se arrancam com enxadas e as queimam; outros costumam às tardes, antes que se recolham, pisarem a terra dos olhos dos formigueiros com pisões muito bem, para que de noite, em que elas dão os seus assaltos, se detenham em tornar a furar a terra para saírem fora, e lançam-lhes de redor folhas de árvores, que elas comem, e das da mandioca velha, com o que, quando saem acima se embaraçam até pela manhã, que se recolhem aos formigueiros." (¹)
Dá vontade de rir, embora não tenha graça nenhuma. É que as palavras do quinhentista Gabriel Soares parecem mostrar que os lavradores da Bahia tratavam com as formigas em uma espécie de lógica humana... Porém, havia ainda mais uma opção, se é que se pode falar assim, na tentativa de impedir danos à lavoura:
"[...] Se as formigas vêm de fora das roças a comer a elas, lançam-lhes desta folha [de mandioca] no caminho, antes que entrem na roça, o qual caminho fazem muito limpo, por onde vão e vêm à vontade, e cortam-lhe a erva com o dente [sic], e desviam-na do caminho." (²)
Então, didaticamente, podemos resumir os procedimentos usuais da seguinte maneira:
I - Quando os formigueiros estavam dentro da roça,
a) podiam ser arrancados e queimados;
b) como alternativa, eram pisados todas as tardes;
c) folhas eram espalhadas ao redor, supostamente para atrapalhar o caminho das formigas.
II - Quando os formigueiros estavam fora da roça, folhas de mandioca eram presenteadas às formigas, na esperança de que, assim satisfeitas, deixassem em paz a plantação.
O resultado prático dessas medidas é discutível, mas os colonizadores achavam que tinham alguma utilidade, ou não perderiam tempo com elas. Sucede que as espécies de formigas existentes no Brasil são quase inumeráveis. Dentre elas, algumas são diurnas, outras têm hábitos noturnos, algumas gostam de atormentar agricultores, enquanto outras, sem convite e sem a menor compostura, invadem as casas, à procura de qualquer coisa que lhes pareça interessante. Os dias da colonização terminaram, mas a guerra contra as formigas está longe de acabar. Alguém ousaria fazer uma aposta quanto ao vencedor?
(1) SOUSA, Gabriel Soares de. Tratado Descritivo do Brasil em 1587. Rio de Janeiro: Laemmert, 1851, p. 163.
(2) Ibid.
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