segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Quão pesada era uma cadeirinha de arruar?

Senhora conduzida por escravos em uma cadeirinha de arruar (¹)

Vou dizendo logo de saída, senhores leitores: não tenho resposta à pergunta que propus no título desta postagem. Não faço a mínima ideia (²). Mas sei de um sujeito que, empiricamente, deve ter descoberto quão pesada era uma cadeirinha de arruar.
O episódio foi contado por Joaquim Manuel de Macedo (sim, o autor de A Moreninha), o médico, professor de História no Colégio Pedro II e escritor, e segundo ele, ocorreu no Rio de Janeiro quando Dom Luís de Vasconcelos era vice-rei no Brasil. Portanto, ainda no Século XVIII, em algum momento entre 1778 e 1790.
De acordo com Macedo (³), que, asseverando a autenticidade do fato afirmava, nesse sentido, ter feito todas as investigações, em um dia de intenso calor João Homem fazia-se carregar em uma cadeirinha por dois escravos, ladeira acima, no Morro da Conceição. Naturalmente vinham os escravos bastante fatigados, suando profusamente, mesmo porque João Homem não era um indivíduo de dimensões lá muito reduzidas.

Cadeirinha de arruar de meados do Século XIX (⁴)

Ora, quem acha que apenas madames eram transportadas em cadeirinhas de arruar está muito enganado. Os do sexo masculino também faziam uso desse meio de transporte. Voltemos, pois, à história de João Homem.
Lá ia a cadeirinha morro acima, quando, descendo, passou por ela o próprio vice-rei, Dom Luís de Vasconcelos. Deixo, agora, que J. M. de Macedo conte o restante:
"Luís de Vasconcelos, que vinha de mau humor, irritou-se, vendo os escravos arquejando de fadiga: mandou-os parar, fez sair da cadeirinha a João Homem, ordenou-lhe que tomasse o lugar de um dos negros, obrigou a este a ir sentar-se dentro da cadeirinha, e lá se foi o senhor, ajudando a carregar o escravo pela ladeira acima.
- É para ensiná-lo a ser mais humano - disse o vice-rei. E depois prosseguiu em seu caminho muito contente de si."
Penso que jamais saberemos o que terá sucedido posteriormente. Seria João Homem capaz de vingar-se do escravo? É possível, tanto quanto é igualmente possível que o temor de que o vice-rei rei tomasse conhecimento da desforra tenha sido suficiente para manter em respeito o despeitado senhor de escravos. O episódio, no entanto, é delicioso, concordam?

(1) Carlos Julião, final do Séc. XVIII ou início do XIX. O original pertence à BNDigital; a imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.
(2) Todas as cadeirinhas de arruar que vi eram confeccionadas em madeira de boa qualidade. Não eram leves, portanto.
(3) MACEDO, Joaquim Manuel de. Um Passeio Pela Cidade do Rio de Janeiro. Brasília: Senado Federal, 2005, p. 98.
(4) H. Lewis, 1848. O original pertence à BNDigital; a imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.


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2 comentários:

  1. A "minha" Cadeirinha de Arruar, ainda bem, é imaginária. Imagino, o quão pesada era!

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    1. Havia cadeirinhas de todo tipo: Lindas e bem acabadas (como a sua, imagino) e outras muito rústicas, para viagens mais longas, e que, em lugar de escravos, eram por vezes transportadas às costas de animais. Vi uma dessas, não faz muito tempo.

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