quarta-feira, 13 de março de 2024

Como o professor particular deveria ser recebido na casa de um aluno

Foi comum, até bem adiantado o Século XIX, que pais com recursos suficientes tivessem professores particulares para os filhos, não apenas para aulas de música, mas para a instrução regular. Nem sempre havia escolas adequadas por perto, existindo, também, quem preferisse ver o filho recebendo aulas dentro de casa. Um livrinho interessante, escrito pela professora Guilhermina de Azambuja Neves, com o título de Entretenimentos Sobre os Deveres de Civilidade, sugeria o modo como um aluno deveria receber seu professor particular para a lição do dia:
"Suponhamos que o mestre toma o trabalho de ir à casa do discípulo para lhe dar as lições. Não se deve jamais fazê-lo esperar, nem esquecer de ter tudo à mão: os livros, o papel, o tinteiro (¹) sobre a mesa e junto desta a cadeira.
Chegando o mestre, deve o menino levantar-se, tomar-lhe o chapéu, o guarda-chuva ou a bengala (²) e convidá-lo a sentar-se.
Começando a lição, será ela ouvida com atenção, e bem assim os conselhos que o mestre der sobre o modo de estudar ou de proceder." (³) 
Iam além as instruções da professora Guilhermina, especificando o modo correto de responder quando o professor ou professora fizesse alguma pergunta:
"O tratamento que se lhe deve dar será o de Sr. Professor; e nas respostas afirmativas ou negativas dir-se-á: sim, senhor, não, senhor; ou se for mestra: sim, senhora, não, senhora." (⁴) 
Quando, finalmente, a aula era concluída, havia um modo correto de agir ao despedir-se o aluno do professor:
"Terminada a lição deve o discípulo agradecer-lhe o trabalho e o interesse que toma por seu progresso nos estudos, entregar-lhe o chapéu, o guarda-chuva ou a bengala, e acompanhá-lo até a escada ou a porta, cumprimentando-o com respeito." (⁵)
Sim, coisas do Século XIX... E qual era a solução do dito século para os meninos que não se mostravam tão polidos e estudiosos? Não é difícil imaginar, e olhem leitores, que mesmo no século seguinte o remédio seria idêntico. Voltemos à professora Guilhermina e seus meigos conselhos:
"Este procedimento é tão bonito, como censurável o do menino Simeão, que nunca sabe as lições, e durante a explicação do mestre ocupa-se em ver passar quem vai pela rua.
Teimoso, vadio e mal-educado, nada sabe, nada aprende e é por isso que os vizinhos o chamam de madraço (⁶).
Sabes qual foi o resultado de tudo isso?
Seus pais resolveram metê-lo de pensionista (⁷) em um colégio, com a recomendação de usarem para com ele de todo o rigor e severidade." (⁸) 
Não é de hoje, portanto, que há quem prefira terceirizar a educação dos filhos, ainda que os métodos, em nosso tempo, tenham mudado. 

(1) Vê-se, nessas palavras, qual era o material escolar mais comum no Século XIX.
(2) Objetos de uso pessoal comuns para homens no Século XIX.
(3) NEVES, Guilhermina de Azambuja. Entretenimentos Sobre os Deveres de Civilidade, 2ª ed. Rio de Janeiro: 1875, pp. 37 e 38.
(4) Ibid., p. 38.
(5) Ibid., p. 39.
(6) "Madraço" significa preguiçoso.
(7) Ou seja, mandaram-no para um internato.
(8) NEVES, Guilhermina de Azambuja. Op. cit., pp. 39 e 40. 


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