No Século XVI, um índio tentou subornar o padre Luís da Grã para ser o primeiro em sua aldeia a receber o batismo
O Padre Simão de Vasconcelos, jesuíta, registrou em sua Crônica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil um episódio interessante, numa ocasião em que o padre Luís da Grã, provincial da Ordem, foi visitar uma certa aldeia indígena, onde outros religiosos já faziam, há tempos, o trabalho de catequese.
Pois bem, tendo Luís da Grã empreendido a pé a jornada até a aldeia, foi, no caminho, rodeado por indígenas que, com alegria, já o aguardavam, pois que a tão festiva data destinava-se ao batismo dos que, tendo sido doutrinados, eram considerados aptos para o sacramento. Foi exatamente por esse motivo que um dentre os índios, ávido pela honra de ser o primeiro dentre os seus a ser batizado, resolveu obter a tão almejada graça por nada menos que uma tentativa de suborno. Escreveu o padre Simão de Vasconcelos:
"[...] Houve tal que determinou levar a coisa por modo de peita, vindo para isso carregado de cera e um bugio, que oferecia ao padre para que o batizasse entre os primeiros, dando juntamente por causa que era velho, e podia faltar-lhe a vida, e perder a dita daquela água que leva ao lugar do descanso." (¹)
É bem possível que Luís da Grã tenha sorrido interiormente diante do que via... De qualquer modo, segundo o registro de Simão de Vasconcelos, tratou os afoitos indígenas bondosamente, tanto os que, ao vê-lo caminhar queriam transportá-lo em rede, como quem ousava tentar suborno para receber o batismo:
"Abraçou o padre a todos: aos que traziam as redes, disse que os pés dos servos de Deus não cansavam; aos que festejavam, que celebrassem embora as vésperas do dia de sua maior ventura (pelo batismo que ao outro dia haviam de receber); aos que pediam ser dos primeiros, disse que teria lembrança, mas fez-lhes uma prática sobre o presente da cera e bugio, e declarou-lhes a grande pureza dos sacramentos da Lei da Graça [...]." (²)
Depois de gentilmente repelir o suborno, o padre Luís da Grã, que devia crer firmemente que corrupção é pecado, impôs suave penitência ao índio que quisera comprar com cera e bugio a primazia entre os catecúmenos: "Em penitência ordenou ao velho que tornasse carregado e entregasse aquelas coisas a sua mulher e filhos." (³)
Exemplo sábio, que bem poderia ter feito adeptos, não apenas nos tempos coloniais, mas pelos séculos dos séculos.
(1) VASCONCELOS, Pe. Simão de S.J. Crônica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil vol. 1 2ª ed. Lisboa: Fernandes Lopes, 1865, p. 167.
(2) Ibid.
(3) Ibid.
Veja também:
Pena que os bons exemplos nunca se tornam muito populares....
ResponderExcluirAbraço
Hahaha, dificilmente têm adeptos numerosos.
Excluir