quarta-feira, 22 de maio de 2024

Batatas da América do Sul para o mundo

Batatas são nativas da América do Sul, mas, a partir das navegações dos Séculos XV e XVI, foram levadas para quase todo o mundo, tornando-se parte essencial da culinária de muitos lugares, cujos habitantes, hoje, sequer suspeitam que seus pratos favoritos talvez nem existissem, não fossem essas solanáceas vindas de muito longe. É preciso dizer, também, que a facilidade com que as batatas se adaptaram em tantas regiões contribuiu, e muito, para que populações inteiras não morressem de fome. Não é pouco, meus leitores.
O que veremos, agora, é como alguns europeus reagiram ao provar batatas pela primeira vez. Começaremos com os homens (¹) que compunham a expedição de circum-navegação começada por Fernão de Magalhães, português a serviço da monarquia espanhola. Antonio Pigafetta, que viajou com Magalhães e escreveu um relato do que presenciou, contou que quando passaram pelo litoral brasileiro e pararam, por alguns dias, em área que corresponde ao Rio de Janeiro, os marinheiros obtiveram alimentos por meio de escambo com indígenas. Entre os itens trocados, estavam algumas batatas: "[...] em troca de um guizo ou de um cinto os indígenas nos traziam batatas, que se parecem com os nabos, e têm sabor semelhante ao de castanhas" (²). A descrição de Pigafetta faz supor que, provavelmente, estavam provando batatas-doces.
Outro que experimentou batatas e escreveu suas impressões foi o mercenário alemão Ulrich Schmidel (³), se aceitarmos que "Padades" são mesmo batatas. Sendo assim, descreveu-as como semelhantes a maçãs (⁴). Estaria falando do formato ou do sabor? Se for pela consistência, é de se pensar que houvesse provado batatas cruas, coisa que não é impossível, se tivermos em consideração o número de vezes em que afirmou, em seus escritos, que ele e seus companheiros estiveram na iminência de morrer de fome (⁵).
Seja como for, as batatas caíram no gosto mundo afora. Terminaremos, portanto, com uma receita de batatas fritas (⁶), extraída da edição portuguesa de um livro de culinária do Século XIX:
"Batatas fritas
Descascai em cru as batatas grandes e claras, parti-as em rodas delgadas; derretei manteiga de vaca, misturando-lhe duas colheres de azeite, frigi as batatas até ficarem duras, tesas e louras, escorrei-as bem sobre peneira de cabelo, e quando estiverem secas servi-as pulverizadas de sal e pimenta." (⁷)
Já provaram algo assim, leitores?

(1) Homens, aqui, é referência apenas a indivíduos do sexo masculino. De acordo com o diário de Antonio Pigafetta, Magalhães proibiu o embarque de mulheres nos navios que comandava.
(2) O trecho citado do Diário de Antonio Pigafetta foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
(3) Veio à América do Sul na expedição de Pedro de Mendoza e esteve na Argentina e no Paraguai, em uma permanência de cerca de vinte anos.
(4) Cf. SCHMIDEL, Ulrich. Warhafftige Historien einer wunderbaren Schiffart. Nürnberg: Levinus Hulsius, 1599, p. 23.
(5) Tão grave era a falta de víveres que enfrentaram, que chegaram à prática da antropofagia.
(6) Homenagem a uma sobrinha que é louca por batatas fritas.
(7) O Cozinheiro Completo ou Nova Arte de Cozinheiro e de Copeiro, 3ª edição. Lisboa: Tipografia de Luiz Correa da Cunha, 1855, p. 114.


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2 comentários:

  1. Texto tão bom quanto batatas fritas. O que seria do mundo sem batatas fritas? No mínimo um pouco mais triste do que é.

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    1. Fritas, assadas... A variedade é enorme. Tenha um ótimo dia, Wendell , obrigada pela visita!

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