quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Um exército indígena para ajudar Cortés

Furioso com a ida de Hernán Cortés ao México, ocorrida sem sua aprovação, o governador espanhol Diego Velásquez enviara, desde Cuba, uma expedição sob o comando de Pánfilo de Narváez, com a finalidade de prender Cortés e pôr fim a seus sonhos de conquista. Isto prova que os ambiciosos conquistadores espanhóis contendiam entre si, buscando, a qualquer preço, o prêmio de honras, glória e, principalmente, riquezas incalculáveis.
Numericamente, a vantagem estava do lado de Narváez. Estima-se que dispunha de três homens para cada um do bando de seu oponente. Apesar disso, Cortés acabou vencendo, por adotar uma estratégia mais eficiente. É verdade, também, que pedira ajuda a chefes locais, e, por relato de Bernal Díaz del Castillo, sabemos que um grupo de mil e quinhentos lanceiros, ao qual denominou "índios de Chinanta" (¹), chegou a Cempoal com a intenção de participar do combate contra Narváez. Um aspecto muito interessante desse fato é que, através dele, pode-se ter uma visão da capacidade bélica dos povos nativos da região que viria a ser conhecida como Nova Espanha: "[...] vinham por capitães os caciques [...] e um de nossos soldados [...], e entraram em Cempoal com perfeita ordem, de dois em dois; e traziam lanças muito longas e encorpadas, e têm nelas [...] lâminas de pedra (²), que cortam como navalhas, [...] e cada índio trazia um escudo redondo, e com suas bandeiras estendidas e com muitas plumagens, tambores e trombetas, e entre cada dois lanceiros um flecheiro [...], e entraram tão corajosos, que era coisa de se notar, e sendo mil e quinhentos, pela maneira e ordem como vinham, pareciam três mil [...]." (³)
Impressiona, de fato, a ordem e disciplina reinantes na tropa indígena, facilmente perceptíveis nessa verdadeira fotografia em palavras feita por Bernal Díaz, cru e autêntico, como sempre. Mas por que razão, afinal, indígenas apoiavam Cortés? Esse astuto conquistador já tivera tempo suficiente para perceber que, entre os povos submetidos ao Império Asteca, reinava o maior descontentamento. Tratou, por conseguinte, de obter seu apoio, sempre que possível com promessas e presentes, mas com uso da intimidação, quando não cooperavam de boa vontade. De um modo geral, portanto, apoiavam Cortés, não só por temor aos espanhóis, mas porque odiavam a dominação asteca. 
Contudo, nesse dia da batalha de Cortés contra Narváez, a versão ameríndia da falange macedônica chegou tarde. À altura de sua entrada em Cempoal, Cortés e seu bando já eram vitoriosos e senhores da situação, Não obstante, no dizer de Bernal Díaz del Castillo, "Cortés falou aos capitães indígenas com muita gentileza, agradecendo sua vinda, deu a eles contas de Castela e mandou que voltassem a suas povoações [...]" (⁴). Sem perder de vista as riquezas do Império Asteca, era prudente angariar o maior apoio possível entre povos descontentes, para aquilo que ainda estava por vir.

(1) Chinantla.
(2) Provavelmente obsidiana.
(3) CASTILLO, Bernal Díaz del. Verdadera Historia de los Sucesos de la Conquista de la Nueva España. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
(4) Ibid.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Democraticamente, comentários e debates construtivos serão bem-recebidos. Participe!
Devido à natureza dos assuntos tratados neste blog, todos os comentários passarão, necessariamente, por moderação, antes que sejam publicados. Comentários de caráter preconceituoso, racista, sexista, etc. não serão aceitos. Entretanto, a discussão inteligente de ideias será sempre estimulada.