quinta-feira, 9 de julho de 2020

A praça do mercado público de Tenochtitlán

Os primeiros europeus, parte do bando de Hernán Cortés, que foram à praça do comércio de Tenochtitlán, a capital asteca, ficaram deslumbrados com o que viram. Reinava ali a maior ordem e limpeza, e vasto mercado público atestava o poderio econômico, bem como o desenvolvimento técnico notável, de uma civilização que, não obstante, estava prestes a naufragar, ante a força e astúcia de invasores.
É certo que a visita dos europeus se fez sob olhares atentos de oficiais astecas, mais que desconfiados das intenções dos "hóspedes". Contudo, Bernal Díaz del Castillo, um soldado jovem naquela ocasião, que, muitos anos depois, decidiu pôr no papel suas recordações desses acontecimentos notáveis (para bem e para mal), guardava vívida memória do que havia visto, e escreveu: "[...] quando chegamos à grande praça, que se diz o Tatelulco (¹), como ainda não a havíamos visto, ficamos admirados da multidão de gente e de mercadorias que nela havia, e da grande organização que em tudo tinham [...]; cada tipo de mercadoria tinha seu lugar marcado" (²).
Os homens de Cortés arregalavam os olhos, e mal podiam conter o espanto. Mais de um deve ter tido ímpeto de se lançar sobre as mercadorias à venda. Acompanhemos Bernal Díaz, que, não por acaso, começou a lista de artigos disponíveis por... Ouro, é claro:
"[...] Comecemos pelos mercadores de ouro, prata e pedras preciosas, plumas, mantas [..], escravos e escravas; digo que eram tantos os que estavam à venda naquela grande praça, como são os negros de Guiné que trazem os portugueses, e estavam atados a umas varas longas e com colares no pescoço para que não fugissem, mas outros andavam soltos." (²)
Não era tudo: 
"Em seguida estavam outros mercadores, que vendiam roupas mais simples e algodão, além de outras coisas de fio torcido, e vendedores de cacau, e desta maneira estavam quantos gêneros de mercadoria há em toda a Nova Espanha, ordenadamente, de modo semelhante ao que há em minha terra, que é Medina del Campo, onde se fazem feiras, que em cada rua estão as mercadorias distribuídas por tipo, e assim estavam na grande praça [...]." (²)
Bernal Díaz notou, também, vendedores de peles de animais, alimentos diversos, objetos de cerâmica, madeira, sal, facas de pedra, machados de vários metais e muitos outros objetos. Não havia tempo para observar tudo de uma vez: "[...] a grande praça estava cheia de gente, era cercada de portais, e em um único dia não seria possível ver tudo o que havia [...]." (²)
Talvez os espanhóis ainda não soubessem, mas mercadores, que, por dever de ofício, viajavam de uma parte a outra do Império Asteca, eram frequentemente recrutados para espionagem. Quem mais poderia bisbilhotar sem levantar suspeitas? Tanta prosperidade, porém, tinha os dias contados. Haveria, é certo, um acervo de peripécias à frente, mas, auxiliados por povos indígenas oprimidos, espanhóis derrotariam os astecas e seus aliados. Um império desabava, tornando em escombros sua cultura, visão de mundo, crenças religiosas, estrutura política e econômica. Como sempre acontece, outro mundo estava prestes a surgir, amalgamando elementos antigos àqueles que traziam os europeus.

(1) Tlatelolco.
(2) CASTILLO, Bernal Díaz del. Verdadera Historia de los Sucesos de la Conquista de la Nueva España. Todos os trechos dessa obra aqui citados foram traduzidos por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.


3 comentários:

  1. Thanks, Agnieszka Mikolajczyk, and welcome here!

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  2. Gosto de me imaginar nessa praça, de me deter em tudo o que por ali houvesse...

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    1. Diria o mesmo, se, além de estar lá, pudesse ser invisível aos circunstantes.
      Um abraço, tenha um ótimo domingo.

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