Um pequeno grupo de jesuítas foi mandado por Manuel da Nóbrega ao interior, com o propósito de iniciar a catequese de indígenas identificados por Anchieta como "ibirajaras". Estavam também incumbidos da tarefa de achar caminho pelo qual fosse possível chegar às terras de colonização espanhola no Paraguai. Iam, entre eles, Pero Corrêa e João de Sousa, missionários.
Interessante a história desse Pero Corrêa. Português, viera ao Brasil como colonizador e, como muitos outros, queria prosperar. Não demorou muito e estava envolvido com o apresamento de indígenas para escravização. Em uma carta escrita em São Vicente em 15 de março de 1555, Anchieta observou: "Era um dos principais portugueses que estavam nesta terra e andava em uma nau, por toda a parte, matando índios ou aprisionando-os, parecendo-lhe que fazia um grande serviço a Nosso Senhor [...]." (¹) Que serviço, prestava ele!...
Mas, um dia, tudo mudou. O caçador de índios resolveu mudar de vida e se tornar jesuíta. Novamente de acordo com Anchieta, "logo que a trombeta de Cristo começou a soar pelos da Companhia, foi ele o primeiro que dobrou o colo ao jugo dela; e dizia muitas vezes, e de tal se persuadira, que se queria salvar-se, era mister que todo se desse ao serviço desses índios, até morrer pela alma deles, não achando nenhuma satisfação com que reparasse o mal que lhes havia feito." (²)
É difícil identificar o que poderia ter provocado tão notável emenda. Seria, talvez, sentimento de culpa, medo das penas eternas (conforme se ensinava na época), quem sabe arrependimento sincero? De qualquer modo, admitido como irmão na Companhia de Jesus, logo estava Pero Corrêa mergulhado na catequese de indígenas, ajudado pelo conhecimento que tinha da língua por eles falada.
Seria até natural, todavia, que os índios, sabendo quem era o sujeito, tivessem medo dele. Não estaria preparando uma armadilha para capturá-los aos milhares?
Pero Corrêa foi jesuíta durante cinco anos, até ser enviado por Nóbrega, com outros religiosos, na expedição para catequese dos "ibirajaras". Ao que parece, a insistência em que abandonassem a antropofagia soou demasiado irritante para os senhores da terra, que resolveram acabar com o incômodo. João de Sousa foi o primeiro a morrer, sob o efeito das flechadas recebidas. Em seguida, foi a vez de Pero Corrêa. Em outra carta, também de 1555, mas escrita em São Paulo, Anchieta relatou: "O irmão Pero Corrêa, vendo isto [a morte de João de Sousa], lhes começou a falar, e a resposta deles era flechadas [...], até que, não podendo mais sofrê-las, deixou o bordão que trazia e se pôs de joelhos, encomendando sua alma ao Senhor [...]." (³) Infere-se que a notícia da morte dos dois missionários tenha chegado a Nóbrega, Anchieta e aos demais jesuítas por boca dos outros integrantes da expedição, que conseguiram escapar.
(1) ANCHIETA, Pe. Joseph de S.J. Cartas, Informações, Fragmentos Históricos e Sermões. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1933, p. 81.
(2) Ibid.
(3) Ibid., p. 76.
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Excelente artigo. Interessante mostrar um bandeirante que virou jesuíta.
ResponderExcluirBoa tarde, Beatriz, obrigada pelo comentário tão gentil, e seja bem-vinda a este blog!
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