terça-feira, 17 de julho de 2018

Como marinheiros sabiam que estavam perto de terra

Embarcação chegando a terra; marinheiros nem
sempre sabiam exatamente onde estavam (¹)

Quando modernos instrumentos náuticos não estavam ainda disponíveis e os mapas eram precários, marinheiros tinham alguns métodos, desenvolvidos com a experiência, para saber se estavam perto de alguma terra. Um deles era fazer sucessivas medições da profundidade do oceano, entendendo que, se as medidas iam se tornando cada vez menores, é porque logo alcançariam ilha ou continente. Vegetais boiando e mesmo a observação de aves que, sabidamente, formavam colônias, também eram vistos como indícios animadores. Foi Pero Vaz de Caminha quem escreveu: "Assim seguimos nosso caminho por este mar de longo, até que terça-feira das Oitavas de Páscoa, que foram vinte e um dias de abril, topamos alguns sinais de terra [...], os quais eram muita quantidade de umas ervas compridas, a que os mareantes chamam botelho, e assim mesmo outras a que dão o nome de rabo-de-asno. E na quarta-feira seguinte, pela manhã, topamos aves a que chamam fura-buxos."
A marujada tinha razão. Em 22 de abril, topariam com terra, muita terra. Mas eles ainda não sabiam que era tanta assim, e Cabral, que comandava o grupo de navios portugueses, iria chamá-la Ilha de Vera Cruz. Atribuir topônimos, nesse tempo, era quase um ritual religioso, de onde se compreende o nome dado ao lugar. Mas não era só.
Olhem para o céu austral, leitores, e vocês verão, lá em cima, o Cruzeiro do Sul (²). Se quiserem saber a localização dos pontos cardeais, basta medir quatro vezes e meia o braço maior da constelação, a partir da Estrela de Magalhães (na base da cruz), e terão a localização aproximada do Sul. Fica fácil, a partir daí, determinar Norte, Leste e Oeste. Em noite limpa, o Cruzeiro do Sul evitava a navegação a esmo, ainda que uma bússola não estivesse disponível. Era, para os marinheiros, a contrapartida, no Hemisfério Sul, daquilo que a Estrela Polar representava no Hemisfério Norte. 
Entretanto, há no Hemisfério Sul outro grupo de estrelas em forma de cruz: é a Falsa Cruz. Um navegador inexperiente, crendo que se orientava pelo Cruzeiro do Sul, podia muito bem arranjar problemas, caso se guiasse pela Falsa Cruz. Agora, leitores vocês já entendem a razão do primeiro nome atribuído ao Brasil, a terra da verdadeira (ou "vera") cruz. Lembrem-se disso, quando virem no céu a famosa constelação.

(1) ARTHUS, M. Gotthart, OTTSEN, Heinrich et alii.  Warhafftige Beschreibung der unglückhafften Schiffarht eines Schiffs von Ambsterdam. Frankfurt am Main: Wolff Richtern, 1604. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.
(2) Ou Crux.


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