quarta-feira, 29 de abril de 2015

Minas de Nossa Senhora do Rosário Meia Ponte (ou simplesmente Pirenópolis)

Igreja Matriz de N. Sra. do Rosário (Pirenópolis - GO)

Hoje chamamo-la Pirenópolis, mas seu nome já foi Minas de Nossa Senhora do Rosário Meia Ponte, seguindo uma antiga tradição de dar nomes gigantescos às povoações (parecia, quem sabe, aumentar-lhes a importância). Como a extensão do nome era cansativa, passou a ser chamada simplesmente Meia Ponte. 
Sobre essa povoação, nascida com a exploração do ouro por bandeirantes na primeira metade do Século XVIII, o padre Ayres de Casal fez constar em sua Corografia Brasílica:
"Meia Ponte, a maior, a mais florescente e comerciante povoação da Província depois da capital, da qual dista vinte e seis léguas para Leste, está junto ao rio das Almas, que ainda é pequeno. [...] É cabeça de Julgado, abastada de carne e peixe, e tem professor régio de Gramática Latina. Seus habitantes e os de seus arredores recolhem milho, trigo, farinha de mandioca, tabaco, algodão, açúcar, algum café; criam gado vacum e muitos porcos; fabricam tecidos de lã e de algodão: o que a faz considerar como o berço e centro da agricultura e indústria na Província." (¹)
A descrição empreendida pelo padre Ayres de Casal é quase neutra, deixando transparecer algumas nuances talvez favoráveis. O que veremos a seguir, meus leitores, é uma amostra de como um mesmo lugar pode ser descrito sob pontos de vista muito diferentes. Veremos as observações de dois outros autores, Luís d'Alincourt e Raimundo J. da Cunha Matos.
Cunha Matos e d'Alincourt eram de nacionalidade portuguesa. Ambos eram militares e vieram ao Brasil sob circunstâncias semelhantes. Estiveram em Meia Ponte na década de vinte do Século XIX. 
O que os senhores leitores preferem: primeiro a descrição favorável ou a essencialmente negativa?
Vamos ao que escreveu d'Alincourt:
"É notável o mau gosto e nenhum desvelo que punham os antigos na fundação dos lugares auríferos, no que bem mostravam que só o ouro formava o seu alvo, e que tudo o mais era nada, em presença de tão precioso ídolo! Por isso é que sempre davam princípio às povoações o mais perto possível do sítio em que mineravam, importando-lhes pouco a irregularidade do terreno, das ruas e edifícios, ainda que próximo houvesse melhor local; assim teve começo, junto ao rio das Almas, que ainda é pequeno, o arraial de Meia Ponte; e até por um capricho mal entendido, edificaram a matriz no pior sítio do largo, em que existe, com frontispício voltado para o máximo declive do mesmo largo, e os fundos que estão em uma cova, para a parte mais espaçosa, o que executaram só para que o templo ficasse próximo à casa de quem tinha concorrido com maior quantia para a sua fundação, o que desta sorte se exigiu. Toda a parte do arraial, que está ao setentrião da matriz, é pior situada, com as ruas dispostas sem ordem nem uniformidade em suas larguras; a outra parte, que fica ao meio-dia da mesma igreja, ocupa terreno mais regular, e as ruas são largas e direitas, porém menos povoadas, à exceção da Nova." (²)
Agora, o Brigadeiro Cunha Matos:
"O arraial tem mais de 1/4 de légua de extensão, e acha-se assentado na margem esquerda do rio das Almas, onde existe uma grande ponte arruinada. O terreno é desigual, mas a parte mais considerável da povoação fica em uma chapada. Tem a bela rua das Bestas, e outra do Rosário, além de diversas de menor extensão; algumas elegantes e espaçosas casas, pela maior parte térreas [...]; tem Casa do Conselho do Julgado e Cadeia; a espaçosa igreja de N. Sra. do Rosário, Matriz Paroquial; outra da mesma invocação; a do Senhor do Bonfim com uma devota imagem de estatura ordinária e sem nenhumas proporções nos seus membros: nesta igreja há ricos ornamentos; a igreja da Lapa e a do Carmo: estas duas estão mui arruinadas." (³)
Não se pode afirmar que Cunha Matos não enxergava os defeitos que tinha diante dos olhos; adotava, porém, ao que parece, o hábito de ver também o que havia de bom e, aspecto curioso, parecia gostar da localização da Igreja Matriz:
"A Igreja Matriz é espaçosa; tem cinco altares mui decentes, e os campanários e frontispício estão para ser reparados. Acha-se assentada na mais pitoresca posição, e dela se desfrutam golpes de vista de natureza admirável." (⁴)

Vista do centro histórico de Pirenópolis - GO
Deixando de lado o mau humor de Luís de d'Alincourt, deve-se salientar o fato de que a Matriz de Nossa Senhora do Rosário que hoje pode ser visitada é produto de muitas reformas, ampliações e alterações ocorridas ao longo dos anos, e até mesmo de uma ampla reconstrução, necessária após o incêndio de 2002. O conjunto arquitetônico do centro histórico de Pirenópolis não é nada desprezível e a cidade guarda uma rica tradição cultural que, aliada à bela paisagem natural que a cerca (Serra dos Pireneus) fazem dela um importante destino turístico no Estado de Goiás.

(1) CASAL, Manuel Ayres de. Corografia Brasílica  vol. 1. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1817, p. 352.
(2) ALINCOURT, Luís d'. Memória Sobre a Viagem do Porto de Santos à Cidade de Cuiabá. Brasília: Ed. Senado Federal, 2006, p. 64.
(3) MATOS, Raimundo José da Cunha. Itinerário do Rio de Janeiro ao Pará e Maranhão Pelas Províncias de Minas Gerais e Goiás. Rio de Janeiro: Typ. Imperial e Constitucional, 1836, p. 151.
(4) Ibid., p. 152.


Veja também:

2 comentários:

  1. Qual é a Ordem religiosa da igreja ?

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    1. Olá, Marcos,
      A Matriz de N. Sra. do Rosário é parte da Diocese de Anápolis - GO. Para informações específicas sobre a Igreja Matriz de N. Sra. do Rosário em Pirenópolis na atualidade, acesse o site http://www.pnssrosario.org.br . Lá você encontrará o link para contato com a administração paroquial.
      Agradeço pela visita ao blog. Volte mais vezes!

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