Era uma vez - por que não? - era uma vez um rei. O rei tinha uma porção de conselheiros, gente da nobreza, funcionários públicos e homens interessados em negócios, que davam palpites no governo, cuidando para fazer o monarca pensar sempre que eram próprias as ideias que favoreciam os interesses de outros. Assim, o rei achava que mandava, a gente da Corte jurava obedecer, como se as ordens reais viessem de Deus, e tudo ficava bem.
Pouco tempo antes, uma frota do reino fizera uma viagem muito longa, alcançando, finalmente, a meta que era perseguida há décadas e lançava gente corajosa em arriscadas aventuras marítimas. O empreendimento se provara lucrativo e era preciso consolidar a nova rota de comércio, além de causar melhor impressão no mandatário das terras distantes, que não ficara muito entusiasmado com a frota anterior que, para dizer a verdade, lhe parecera insignificante.
Dessa vez o rei queria fazer bonito e mandou para o mar uma bela expedição, com o que havia de melhor em navios, com muitos marinheiros, sob o comando de alguns dos melhores navegadores do reino. A festa de despedida dos que iam viajar para tão longe foi muito concorrida. O rei em pessoa compareceu.
Já no mar, a frota dirigiu-se um pouco mais que o habitual para oeste, parou em um lugar aparentemente desconhecido e aproveitou para reabastecer as reservas de água, embora, naquele momento, não houvesse falta dela. Por ordem do comandante, um navio voltou ao reino para entregar notícias ao rei daquilo que até ali se fizera, enquanto os demais seguiram viagem, não sem trabalhos e perdas significativas. O rei mandara, seus fiéis servidores obedeciam, mesmo ao preço da vida.
Lição de casa para vocês, leitores: coloquem os nomes corretos em personagens e lugares, além de datas, nesta historinha. E vamos falar sério.
Vasco da Gama, que liderou a armada que chegou às Índias em 1498, completando a sonhada rota marítima ao Oriente, levava consigo uns cento e sessenta homens, entre marinheiros e soldados, em apenas quatro navios. Já a frota sob o comando de Cabral, que zarpou de Portugal em 9 de março de 1500, era composta por treze embarcações e levava mais de mil homens. A diferença era enorme.
Portanto, que fique entendido de uma vez por todas: a esplêndida frota comandada por Cabral foi aparelhada para ir às Índias, não para descobrir o Brasil, independentemente de ter o descobrimento ocorrido como um acidente de percurso ou de ser um objetivo secundário da empresa. A expectativa no Reino, ao enviar gente para repetir a viagem de Vasco da Gama, era firmar relações sólidas de comércio no Oriente, possibilitando a remessa constante de especiarias - no sentido amplo - para a Europa, assim abrindo portas para lucros estratosféricos. Ninguém lançaria ao mar um conjunto de treze luzidos navios, com tantos marinheiros, entre os quais alguns dos mais distintos navegadores portugueses, para ir a um lugar que ninguém sabia o que era, se era, e onde era. Essa é a realidade em relação ao descobrimento do Brasil, por menos lisonjeira que pareça.
"Ninguém lançaria ao mar um conjunto de treze luzidos navios, com tantos marinheiros, entre os quais alguns dos mais distintos navegadores portugueses, para ir a um lugar que ninguém sabia o que era, se era, e onde era."
ResponderExcluirConvicção de historiadora, que eu respeito. Mas será que sabemos tudo? temos todos os dados ao nosso dispor para uma afirmação tão cabal? :)
Calma, é apenas uma provocaçãozinha, Marta. :)
Fique bem e... receba um abraço :)
É certo que não sabemos tudo, ainda que gostemos de imaginar que somos oniscientes... Vai que um dia desses a gente descubra que havia, para as navegações, razões muito além de nossa imaginação mais fértil... É nisso exatamente que está a graça, por isso é que estudamos e estudamos. Como diria Salomão ( o sábio rei hebreu da Antiguidade), não há limite para se fazer livros, e, portanto, continuamos a escrever. Basta apenas a humildade de entender que, nestas questões, dificilmente haverá absolutos.
ExcluirUm abraço, tenha uma ótima semana!