sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Sobre a dignidade do trabalho

"O trabalho, ele o tinha como vergonha, pois o poria ao nível do escravo. Prejuízo este, que desde tempos remotos dominava a caipiragem de São Paulo, e se apurava nesse homem, cujo espírito de sobranceira independência havia robustecido a luta que travara contra a sociedade."
                                                                                                                                   José de Alencar, Til

Formalmente, ninguém, em são juízo, ousa negar o valor do trabalho - todo e qualquer trabalho, que dá dignidade ao homem, etc., etc., etc. No Brasil, porém, até por consequência dos séculos de escravidão, ainda há quem imagine que o melhor que pode acontecer a alguém é jamais ter que trabalhar. Outro absurdo é a carência de técnicos qualificados, enquanto o país transborda de diplomas de cursos superiores que, infelizmente, nem sempre vêm acompanhados do saber e competência correspondentes.
Soldados gregos - desenho a partir de um
baixo-relevo (*).
Militares eram muito valorizados entre os espartanos.
Tal coisa não é, em absoluto, uma novidade debaixo do céu. Heródoto, do quinto século antes de Cristo, observou que tanto entre os egípcios como entre grande parte dos gregos havia uma certa propensão ao desprezo das profissões que envolviam trabalho manual. Notou ele que os "bárbaros" eram dados a valorizar os militares e os que executavam trabalhos nos quais se requeria esforço mental. Por outro lado, os que os que exerciam labores ditos mecânicos (envolvendo, por exemplo, as ocupações artesanais e o trabalho agrícola, este último frequentemente relegado aos escravos), eram menosprezados, assim como seus descendentes. Entre os gregos, asseverou, a mesma coisa podia ser vista, particularmente entre os espartanos, embora os cidadãos de Corinto fossem, nesse aspecto, uma exceção, já que faziam com que em sua pólis os artesãos fossem muito respeitados.
Parece que essa mania atravessou os séculos e chegou em excelente forma aos nossos dias. Sim, como já disse, no Brasil, tal praga está ligada à existência não muito remota da escravidão, que, ao menos no plano da mentalidade, aviltava o trabalho aos olhos dos homens livres. Uma  grande lástima. Apenas pergunto: quanto ainda durará?

(*) ADAMS, W. H. Davenport. Temples, Tombs and Monuments. London: T. Nelson and Sons, 1871, p. 44. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.


Veja também:

2 comentários:

  1. Respostas
    1. Infelizmente, o problema é quase universal (há exceções) e não parece haver perspectiva de mudança.

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