Setenta anos se haviam passado desde a fundação, por missionários jesuítas, do pequenino Colégio de São Paulo. A vila de mesmo orago crescera nas imediações, e já era famosa pelas marmeladas, pelas plantações de trigo, pela criação de porcos e pela escravização de indígenas, capturados, sertão adentro, por levas de paulistas que faziam o "descimento do gentio", fosse para trabalho compulsório em suas próprias fazendas, fosse para venda em outras localidades. Para disfarçar o que, de fato, era escravidão, falava-se em "índios administrados", e "serviço dos forros", que, aliás, quase sempre só eram forros no nome.
Uma ata da Câmara de São Paulo, datada de 27 de janeiro de 1624, mostra, contudo, que os colonizadores nem sempre estavam tão seguros com a presença dos cativos. Dizia ela:
"Aos vinte e sete dias do mês de janeiro do ano presente de mil e seiscentos e vinte e quatro [...] nesta vila de São Paulo [...] se juntaram em câmara os oficiais dela [...] e sendo juntos em câmara puseram em prática as coisas do bem comum da terra e requereu o procurador aos [...] oficiais da câmara [...] que os negros dos brancos e das aldeias não tragam arcos, pelo muito dano que fazem matando as criações dos moradores [...]." (¹)
Os "negros" a que o procurador se referiu eram ditos "dos brancos e das aldeias", subentendendo-se, portanto, a escravização. A menção às aldeias, provavelmente, era relativa àquelas em que indígenas viviam sob a tutela dos jesuítas ou sob as ordens de um oficial conhecido como "capitão dos índios". Mas "negros"? Seriam escravizados de origem africana?
Não, na época quase sempre o termo "negro" era aplicado a quem fosse escravizado, independentemente de sua origem étnica, e isto fica claro quando, na mesma ata, se vê, sob o registro do escrivão, o que é que decidiram os senhores camaristas de São Paulo: "[...] mandaram [...] que nenhum negro do gentio da terra não entrasse nesta vila com arco, para evitar o dito dano [...]." (²)
Ora, sabe-se que os arcos eram armas que indígenas manejavam com notável habilidade, e talvez galinhas, porcos, cães e vacas fossem alvos fáceis, uma verdadeira tentação para exercício de pontaria. Contudo é lícito conjecturar que a razão para o interdito fosse outra: os colonizadores eram, ainda, pouco numerosos; muitos eram os indígenas, escravizados ou livres. Reunidos dentro da vila e munidos de arcos e de boa quantidade de flechas, poderiam causar muito dano, não só "matando as criações", como dizia a ata, mas contra os próprios moradores. Indígenas, armados e numerosos, seriam, pois, motivo de preocupação, ainda que, nesse tempo, muitos dos colonizadores já se houvessem aparentado com eles.
Uma ata da Câmara de São Paulo, datada de 27 de janeiro de 1624, mostra, contudo, que os colonizadores nem sempre estavam tão seguros com a presença dos cativos. Dizia ela:
"Aos vinte e sete dias do mês de janeiro do ano presente de mil e seiscentos e vinte e quatro [...] nesta vila de São Paulo [...] se juntaram em câmara os oficiais dela [...] e sendo juntos em câmara puseram em prática as coisas do bem comum da terra e requereu o procurador aos [...] oficiais da câmara [...] que os negros dos brancos e das aldeias não tragam arcos, pelo muito dano que fazem matando as criações dos moradores [...]." (¹)
Os "negros" a que o procurador se referiu eram ditos "dos brancos e das aldeias", subentendendo-se, portanto, a escravização. A menção às aldeias, provavelmente, era relativa àquelas em que indígenas viviam sob a tutela dos jesuítas ou sob as ordens de um oficial conhecido como "capitão dos índios". Mas "negros"? Seriam escravizados de origem africana?
Não, na época quase sempre o termo "negro" era aplicado a quem fosse escravizado, independentemente de sua origem étnica, e isto fica claro quando, na mesma ata, se vê, sob o registro do escrivão, o que é que decidiram os senhores camaristas de São Paulo: "[...] mandaram [...] que nenhum negro do gentio da terra não entrasse nesta vila com arco, para evitar o dito dano [...]." (²)
Ora, sabe-se que os arcos eram armas que indígenas manejavam com notável habilidade, e talvez galinhas, porcos, cães e vacas fossem alvos fáceis, uma verdadeira tentação para exercício de pontaria. Contudo é lícito conjecturar que a razão para o interdito fosse outra: os colonizadores eram, ainda, pouco numerosos; muitos eram os indígenas, escravizados ou livres. Reunidos dentro da vila e munidos de arcos e de boa quantidade de flechas, poderiam causar muito dano, não só "matando as criações", como dizia a ata, mas contra os próprios moradores. Indígenas, armados e numerosos, seriam, pois, motivo de preocupação, ainda que, nesse tempo, muitos dos colonizadores já se houvessem aparentado com eles.
(1) O trecho da ata aqui citado foi transcrito na ortografia atual, com acréscimo da pontuação indispensável à compreensão, para não fatigar o cérebro e a paciência dos leitores deste blog.
(2) Ibid.
Veja também:
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Democraticamente, comentários e debates construtivos serão bem-recebidos. Participe!
Devido à natureza dos assuntos tratados neste blog, todos os comentários passarão, necessariamente, por moderação, antes que sejam publicados. Comentários de caráter preconceituoso, racista, sexista, etc. não serão aceitos. Entretanto, a discussão inteligente de ideias será sempre estimulada.