Nos tempos coloniais, os móveis para uso doméstico eram, quase sempre, bastante rústicos, ainda que houvesse gente de muitas posses que trazia mobiliário do Reino e, portanto, caríssimo, para os padrões da época. Mas hoje, meus leitores, trataremos apenas dos móveis usados no Brasil principalmente no Século XIX e começo do Século XX.
Antes da era da produção em massa, móveis eram feitos frequentemente em oficinas nas quais artesãos trabalhavam atendendo a encomendas. Assim produzidos, nada tinham de descartáveis, eram quase obras de arte e passavam como herança de uma geração a outra. Não era incomum que tivessem detalhes e adornos entalhados à mão, de modo a aumentar sua beleza e valor. Apenas os muito ricos substituíam os móveis, de vez em quando, para atender a uma nova moda, que, como é fácil imaginar, não mudava com a mesma facilidade de hoje. Aos de menos recursos ficava o mobiliário simples, composto em geral por uma mesa, poucas cadeiras, talvez um armário, camas (se o costume não fosse o de dormir em rede), e, onipresente, um oratório de boa madeira para os santos da devoção da família, e dificilmente algo além disso.
Anúncio de compra de móveis usados, 1852 (¹) |
Um anúncio publicado em 1852 no jornal Aurora Paulistana dizia: "Quem tiver uma pequena mobília em meio uso, para vender, constando de meia dúzia de cadeiras de palhinha, uma meia cômoda, e um sofá, dirija-se à rua de S. Bento, nº 61" (¹). Infelizmente, não sabemos quem era o interessado nos ditos móveis. Seria, talvez, um estudante da Faculdade de Direito, vindo de alguma localidade distante e que precisava estabelecer moradia temporariamente na cidade? Ou talvez alguém de poucos recursos, mas com casamento à vista? São apenas hipóteses, podia ser coisa bem diferente.
No interior do Brasil não era incomum que coubesse aos próprios usuários a tarefa de fazer os móveis rústicos de que tinham necessidade, na falta de profissionais especializados. Em comum porém, com a mobília fina das casas senhoriais, tinham a madeira excelente das florestas brasileiras, embora nem sempre as mesmas espécies fossem empregadas. Peroba, por exemplo, era coisa de mobiliário barato, segundo explicação de Joaquim Floriano de Godoy, senador do Império: "Na marcenaria [a peroba] só é empregada para a confecção de mobílias ordinaríssimas, porque [...] abre-se facilmente e porque a bonita cor que mostra no momento em que é lavrada desaparece prontamente pela ação do ar e da luz" (²). Aratibá era madeira somente para mobiliário pesado: "Em razão de fender-se com facilidade, apesar de uma bonita cor, [aratibá] é pouco empregada na marcenaria e só em objetos de grande volume, como armários, guarda-roupas, presta-se relativamente a esse destino" (³).
Por outro lado, Godoy lembrou que, em Campinas - SP, caviúna era a madeira mais desejada para o mobiliário fino nos casarões habitados por barões do café e suas famílias: "O cabiúna ou caviúna [...], cujo lenho é pesado, resistente aos instrumentos cortantes, pouco poroso, de cor mais ou menos escura e elegantemente rajado de laivos quase negros, algumas vezes rodeados de modo a assemelhar-se à tartaruga, é, por causa do seu lindo aspecto e mais qualidades, a única que no município [de Campinas] se emprega na marcenaria para a confecção de mobílias de luxo. É de duração na terra. Na Europa é conhecida e muito estimada" (⁴).
No interior do Brasil não era incomum que coubesse aos próprios usuários a tarefa de fazer os móveis rústicos de que tinham necessidade, na falta de profissionais especializados. Em comum porém, com a mobília fina das casas senhoriais, tinham a madeira excelente das florestas brasileiras, embora nem sempre as mesmas espécies fossem empregadas. Peroba, por exemplo, era coisa de mobiliário barato, segundo explicação de Joaquim Floriano de Godoy, senador do Império: "Na marcenaria [a peroba] só é empregada para a confecção de mobílias ordinaríssimas, porque [...] abre-se facilmente e porque a bonita cor que mostra no momento em que é lavrada desaparece prontamente pela ação do ar e da luz" (²). Aratibá era madeira somente para mobiliário pesado: "Em razão de fender-se com facilidade, apesar de uma bonita cor, [aratibá] é pouco empregada na marcenaria e só em objetos de grande volume, como armários, guarda-roupas, presta-se relativamente a esse destino" (³).
Por outro lado, Godoy lembrou que, em Campinas - SP, caviúna era a madeira mais desejada para o mobiliário fino nos casarões habitados por barões do café e suas famílias: "O cabiúna ou caviúna [...], cujo lenho é pesado, resistente aos instrumentos cortantes, pouco poroso, de cor mais ou menos escura e elegantemente rajado de laivos quase negros, algumas vezes rodeados de modo a assemelhar-se à tartaruga, é, por causa do seu lindo aspecto e mais qualidades, a única que no município [de Campinas] se emprega na marcenaria para a confecção de mobílias de luxo. É de duração na terra. Na Europa é conhecida e muito estimada" (⁴).
Quando a produção em maior escala começou a ganhar impulso, os móveis tinham, ao menos na aparência, alguma semelhança com o antigo mobiliário artesanal. Mas fatores como preço e demanda foram, aos poucos, introduzindo novos padrões, em associação com a necessidade de maior praticidade exigida para as casas e famílias modernas - sim, a gente que vivia no começo do Século XX se julgava muito moderna, como, aliás, pensamos todos nós, hoje, e pensarão, provavelmente, os que vierem depois.
Graças à qualidade das madeiras empregadas, quem gosta de móveis antigos pode, até hoje, vê-los facilmente, e nem é necessário ir a museus. Basta uma visita ao antiquário mais próximo, com a vantagem de ser possível comprar e levar para casa aquilo que mais agradar.
Graças à qualidade das madeiras empregadas, quem gosta de móveis antigos pode, até hoje, vê-los facilmente, e nem é necessário ir a museus. Basta uma visita ao antiquário mais próximo, com a vantagem de ser possível comprar e levar para casa aquilo que mais agradar.
(1) AURORA PAULISTANA, Ano I, nº 61, 15 de julho de 1852, p. 4.
(2) GODOY, Joaquim Floriano de. A Província de S. Paulo. Rio de Janeiro: Typ. do Diário do Rio de Janeiro, 1875, p. 33.
(3) Ibid., p. 34.
(4) Ibid.
(5) O ECHO, Ano XV, nº 4. São Paulo, outubro de 1916.
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