segunda-feira, 14 de novembro de 2016

A utilidade do ensino de um ofício aos escravos

Escravos serrando madeira, de acordo com Debret (¹)

De um modo geral, escravos treinados em um ofício manual tinham, no mercado, um preço mais alto do que aquele que era praticado em relação aos demais cativos. Mas, além do valor de mercado, havia outra razão para ensinar uma profissão aos escravos: é que as fazendas, isoladas como eram costumeiramente, precisavam de trabalhadores que atendessem às necessidades locais. De outro modo, seria difícil, em áreas agrícolas, contratar mão de obra, fosse livre ou escrava, para determinadas tarefas.
O segundo barão de Paty do Alferes, Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, em sua Memória Sobre a Fundação e Custeio de uma Fazenda, cujo objetivo era dar instruções ao filho que iria começar a vida de fazendeiro, escreveu:
"Tende o cuidado logo, em princípio, de pôr alguns escravos moços a aprender os ofícios de carpinteiro, ferreiro e pedreiro; em pouco tempo estarão oficiais e tereis de casa operários, tendo-vos assim aproveitado do tempo despendido na aprendizagem.
Não vos esqueçais de fazer ensinar também algum a oleiro para fazer a telha e tijolo para o gasto da fazenda." (²)
O ensino de um ofício aos escravos resultava, portanto, na conveniência de ter trabalhadores qualificados à disposição, mas também em economia. Quanto à recomendação de ensinar "escravos moços", o motivo, facílimo de compreender, é que seria provável tê-los por mais tempo.
Já nas cidades, era bom negócio ser proprietário de um escravo qualificado em um ofício, uma vez que era costume alugar seus serviços a quem deles precisasse. A renda, é óbvio, ia para as mãos, ou melhor, para os bolsos do senhor, embora sempre houvesse um caso ou outro em que, para estímulo ao trabalho, à obediência, e para evitar fugas, se desse ao escravo uma pequena parte do valor obtido com a diária. Era, sim, uma brutal exploração, que muita gente, submersa na lógica escravista, nem conseguia enxergar e achava a coisa mais normal deste mundo. 

(1) DEBRET, J. B. Voyage Pittoresque et Historique au Brésil vol. 2. Paris: Firmin Didot Frères, 1834. O original pertence à Brasiliana USP; a imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog. 
(2) WERNECK, Francisco Peixoto de Lacerda. Memória Sobre a Fundação e Custeio de uma Fazenda na Província do Rio de Janeiro 2ª ed. Rio de Janeiro: Laemmert, 1863, p. 50.


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