A Nobiliarchia Paulistana, de Pedro Taques de Almeida Paes Leme, contém várias referências a pessoas que, vivendo em São Paulo (então Capitania de São Vicente) no século XVII, foram bem-sucedidas em suas tentativas de cultivar, no Brasil, árvores frutíferas cujas mudas ou sementes vinham da Europa. É válido recordar que, remotamente, muitas dessas espécies eram de origem asiática, contudo, sendo cultivadas na Europa há muito tempo, os colonizadores portugueses dominavam amplamente as técnicas adequadas para torná-las produtivas. Selecionei dois casos desses cultivadores, que são de bastante interesse.
Vamos ao primeiro. Trata-se de um português, Antônio Castanho da Silva, natural de Tomar que, tendo-se estabelecido em Santana de Parnaíba, aí empreendeu o cultivo de um pomar que, devido à natureza das espécies escolhidas, sobreviveu por muito mais tempo que seu fundador:
"Fez assento na vila de Parnaíba, em cujo termo fundou uma fazenda de cultura com um pomar das frutas de Europa. Nela teve grande número de nogueiras, que foram as primeiras que houveram naquela capitania, as quais excediam no tamanho às da Europa. Porém o tempo que tudo destrói, veio a deixar em decadência esta grande fazenda com a morte de Antônio Castanho da Silva, tendo antes estado muitos anos ausente no reino do Peru e minas de Potosí, onde faleceu. Ainda pelos anos de 1735 existiam algumas nogueiras, das quais colheu uns quatro alqueires o visitador dos monges beneditinos frei Antônio da Luz, passando para a vila de Sorocaba, como publicava o mesmo pela novidade que lhe causou."
Sabe-se que Antônio Castanho da Silva faleceu a 9 de fevereiro de 1622. Portanto, seu "pomar de frutas da Europa", deve ter sido plantado, talvez, ainda no século XVI.
Um outro caso, também referido na Nobiliarchia Paulistana, é o de Salvador Pires de Medeiros, este um cultivador de videiras, como se lê no seguinte trecho:
"Salvador Pires de Medeiros foi capitão da gente de São Paulo pelos anos de 1620, como pessoa das principais da terra, que assim se declara na sua carta-patente, registrada na Câmara de São Paulo no Livro de Registro, título 1620, p. 12. Foi grande paulista, abundante em cabedais, estabelecido na serra, no sítio do Ajuá, onde teve uma fazenda de grandes culturas e uma dilatada vinha, da qual todos os anos recolhia excelente vinho malvasia com muita abundância."
Alguém poderá perguntar-se por que chegavam esses cultivos a ser abandonados, uma vez que eram produtivos? Embora não se tenha sobre o assunto tanta documentação quanto seria desejável, são possíveis algumas conjecturas:
a) A Metrópole não esperava da Colônia aquilo que se podia produzir em Portugal - o incentivo era todo para o cultivo de produtos tropicais, que, esses sim, chegariam a ser vendidos na Europa por preços elevados;
b) Paulistas desses tempos eram gente dada a correr os sertões, com ou sem permissão das autoridades, de modo que, indo em busca do ouro, não hesitavam em abandonar suas pacatas atividades agrícolas pela vida mais emocionante - e perigosa - das selvas do Brasil;
c) Nem todas as espécies que se tentaram introduzir no Brasil adaptaram-se bem a São Paulo e, como já disse na postagem anterior, foi somente a partir do século XX, quando pesquisas sistemáticas começaram a ser feitas para o desenvolvimento de variedades compatíveis com as condições naturais da região, que algumas delas puderam, efetivamente, ser adotadas em escala comercialmente viável.
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