sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Gado andava solto dentro da vila de São Paulo no Século XVII


Havia gado passeando à vontade pelas ruas da vila de São Paulo no Século XVII. Por consequência, havia vestígios da passagem dos animais em toda parte, o que incluía o adro das igrejas. Que falta de respeito!...
Diante disso, a Câmara da vila decidiu, em 22 de novembro de 1624, que os proprietários dos animais deveriam ser notificados para limpar os arredores das igrejas, ainda que não se fizesse menção de mantê-los em lugar seguro, longe das vias públicas e residências:
"[...] pelos oficiais foi acordado que o gado que anda nesta vila faz muito dano às igrejas, pelo que mandaram fossem notificados os donos deles, a saber, Bartolomeu Gonçalves tenha cuidado de limpar o adro do Colégio (¹) e o adro da Santa Misericórdia, e Aleixo Jorge tenha cuidado de limpar o adro da Matriz e o adro de Nossa Senhora do Carmo, [...] terão cuidado de mandarem fazer isto todos os dias [...]." (²) 
Seria apenas mais uma notificação de rotina na administração da vila de São Paulo, a não ser pelo fato de que o escrivão das execuções, a quem competia fazer as notificações, simplesmente se recusou a tal tarefa, levando os camaristas, em 21 de dezembro, à decisão de afastá-lo das funções que exercia pelo prazo de quinze dias. 
Recomendou-se, em seguida, que o escrivão da Câmara efetuasse as notificações. Problema resolvido? Não, ao que parece, porque no ano seguinte já com novos oficiais (³), o assunto do gado que andava solto na vila voltou a ser discutido, sendo, desta vez, ordenado aos proprietários que prendessem os animais à noite, porque causavam problemas não só no adro das igrejas, mas em outros pontos da povoação: 
"[...] foi mandado a mim, escrivão, notificasse Aleixo Jorge e Bartolomeu Gonçalves, que cada um deles, com pena de cinco tostões [...], todas as noites mandassem encerrar o seu gado, visto danificar o adro das igrejas nesta vila e as casas dos moradores e os caminhos e entradas desta vila, tudo estava danificado, o que era em prejuízo deste povo [...]." 
A multa estipulada, em caso de desobediência, não era grande coisa, mas havia falta crônica de dinheiro amoedado na vila. Não é impossível que, eventualmente, proprietários de gado achassem que valia a pena ignorar as ordens da Câmara. Esses prosaicos incidentes mostram, contudo, como era a prosaica vida na prosaica vila de São Paulo pelas alturas do Século XVII. Quem ousaria falar em expulsão do gado e de seus proprietários, sabendo que, nesse tempo, era difícil encontrar quem fornecesse carne suficiente para a população?

(1) Tratava-se do Colégio dos Jesuítas. 
(2) Os trechos de atas da Câmara de São Paulo aqui citados foram transcritos na ortografia atual, com acréscimo da pontuação indispensável à compreensão.
(3) As eleições para a administração local eram anuais. 


Veja também:

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Democraticamente, comentários e debates construtivos serão bem-recebidos. Participe!
Devido à natureza dos assuntos tratados neste blog, todos os comentários passarão, necessariamente, por moderação, antes que sejam publicados. Comentários de caráter preconceituoso, racista, sexista, etc. não serão aceitos. Entretanto, a discussão inteligente de ideias será sempre estimulada.