quinta-feira, 17 de novembro de 2022

Vida dura para os cães em São Paulo no Século XIX

Esqueçam as ONGs que, atualmente, protegem animais: no Século XVI, quando São Paulo era uma povoação pequenina, com poucos habitantes e separada do litoral pelo escabroso Caminho do Mar, matar cães incômodos era uma prática habitual. Não havia muita piedade para eles, embora a Câmara local insistisse com os proprietários para que, evitando o abate, tratassem de prender os animais. O tempo voa, todos sabem, mas no Século XIX, conforme já veremos, a situação dos caninos de rua ainda não havia se tornado melhor. Querem prova? 
Em março de 1820 uma postura da Câmara de São Paulo dizia:
"Que nenhuma pessoa conserve dentro desta cidade cães de qualidade alguma às suas portas, ou que andem pelas ruas, exceto tendo-os ou trazendo-os com açaimos ou focinheiras de couro, de forma que não possam fazer mal; sob pena de serem mortos, e seu dono pagar seis mil réis, a metade para o Concelho (¹) e a outra para quem os matar." (²)
Ninguém gosta de encontrar um cão ameaçador à solta na rua. Era justo, portanto, que se exigisse dos proprietários que mantivessem os cães sob o devido controle, mas é significativo que houvesse até um prêmio para quem desse um fim à existência de animais de comportamento inconveniente.  O sacrifício de animais voltaria a ser assunto em uma sessão da Câmara em 30 de setembro de 1820, quando o escrivão registrou:
"Na mesma representou que o juiz almotacel lhe pedira pólvora e chumbo para a matança dos cães inúteis, na conformidade das posturas desta Câmara, a quem foi recomendado pela mesma para sua execução; e porque além disso tem havido muitos cães danados (³); portanto determinava esta Câmara que o procurador assistisse com a pólvora e chumbo preciso todas as vezes que pelo dito almotacel lhe for pedido."
Não havia nesse tempo e lugar uma instituição com autoridade para proteger e cuidar de animais abandonados. Eliminar cães indesejados se tornava, portanto, quase uma operação de caça ou prática de tiro ao alvo. E certo que, sob esse aspecto, houve, em nossos dias, uma mudança para melhor. 

(1) Unidade municipal.
(2) Os trechos de atas da Câmara de São Paulo aqui citados foram transcritos na ortografia atual, com acréscimo da pontuação indispensável à compreensão.
(3) Com hidrofobia. Lembrem-se, leitores, de que nesse tempo não havia vacina antirrábica.


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