quinta-feira, 18 de junho de 2020

O corte de cabelo de Teseu

Cabelos longos ou curtos? Na Antiguidade havia quem os quisesse longos, enquanto outros gostavam de tê-los bem curtos. Questão de gosto e costume, sim, mas era, também, questão de conveniência na guerra. Barbas e cabelos longos podiam ser desvantagem em um combate corpo a corpo. 
Glorificando as virtudes de Teseu, herói ateniense, Plutarco explicou, em Vitae parallelae: "Todos os rapazes daquele tempo, no momento em que deixavam de estar sob a disciplina dos mestres, o que acontecia por volta dos quatorze anos, tinham por tradição o dever de ir a Delfos e, em seu templo, oferecer a Apolo o primeiro corte dos cabelos, como um sacrifício de agradecimento. Seguindo o costume de seu lugar de nascimento, Teseu foi a Delfos e lá cortou os cabelos, mas apenas aqueles que ficavam na parte frontal da cabeça [...]" (¹). Portanto, meninos gregos usavam cabelos longos, mas, logo que chegavam à idade militar, deviam cortá-los e, religiosamente, oferecê-los a Apolo. 
Deixando de lado o que pode haver de lendário na história de Teseu, é inegável que o costume grego de que rapazes cortassem os cabelos em Delfos, oferecendo-os a Apolo, encontra eco na tradição romana de que os jovens, no dia em que deixavam de usar a toga pretexta, passando a vestir a toga viril, oferecessem os fios da primeira barba que faziam em um templo, queimando-os sobre um altar. Passavam, nessa ocasião, a ser reconhecidos como homens adultos, o que incluía, ao lado dos privilégios inerentes a um cidadão romano, o dever do serviço militar.
Alexandre, o Grande (³)
Alexandre da Macedônia, ainda conforme Plutarco, via também inconveniência em barbas exageradas nos soldados - considerem, leitores, a hipótese de uma luta corpo a corpo: "Alexandre, rei da Macedônia, sendo sábio, percebeu os males que poderiam vir e, assim, estabeleceu um regulamento para os soldados de seu exército, pelo qual os macedônios estavam obrigados a cortar a barba, para que, durante o combate, não fossem, por causa delas, atingidos pelos inimigos" (²). Não será absurdo, portanto, conjecturar que o costume religioso de oferecer barbas e cabelos aos deuses cumpria uma função muito útil, convencendo a população masculina a fazer um verdadeiro sacrifício (em mais de um sentido), nesses tempos remotos em que instrumentos cortantes não eram nada confiáveis.

(1) PLUTARCO. Vitae parallelaeOs trechos citados nesta postagem foram traduzidos por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias.
(2) Ibid.
(3) HEKLER, Anton. Die Bildniskunst der Griechen und Römer. 
Stuttgart: Julius Hoffmann, 1912, p. 60. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog. 


2 comentários:

  1. Teseu, pelos vistos, adaptava a tradição ao seu próprio gosto.
    Muito sangue deve ter escorrido nas faces dos homens daquele tempo. :)

    Tenha uma boa semana, Marta :)

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    1. Fico imaginando o aspecto dos sobreviventes ao final de uma batalha. Devia ser lamentável, ainda que motivo de orgulho para os vencedores.

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