quinta-feira, 12 de setembro de 2019

As ruas desalinhadas de cidades coloniais

Muitas cidades nascidas nos tempos coloniais tinham ruas em completo desalinho. Isso se explica porque o povoamento aconteceu ao sabor da necessidade, sem que alguém tivesse a ideia de fazer um planejamento. Mesmo que tal coisa existisse, seria pouco provável que fosse seguida, se levarmos em conta que muitos colonizadores estavam desesperados por fazer dinheiro tão rápido quanto possível, para voltar ao Reino em uma posição econômica superior à que tinham na ocasião da saída (¹). 
Em certos casos, cidades assim estabelecidas passaram, séculos mais tarde, por algum tipo de reforma, envolvendo a demolição de prédios antigos e a criação de um novo arruamento, para oferecer ao lugar um aspecto de modernidade, banindo da cena os improvisos coloniais. Em outros casos, ficou existindo um "centro velho" ou "centro histórico", mais ou menos preservado, enquanto a urbanização condizente com os novos tempos fez brotar novas áreas de ocupação humana nos arredores. 
Parece, no entanto, que, em relação aos núcleos urbanos nascidos com a mineração, pode haver, além da falta de planejamento e da influência do relevo, mais uma explicação para as ruas tortuosas, segundo o que disse Joaquim Ferreira Moutinho, um português que residiu por dezoito anos em Cuiabá, isso no Século XIX, quando a fúria mineradora já havia acabado há muito tempo. As ruas que compunham o centro da cidade, eram, em suas palavras, "todas elas cortadas por becos na maior parte tortuosos, como os de todas as cidades antigas que devem sua origem a mineiros, que as construíam de modo que seus habitantes estivessem sempre juntos, e pudessem assim acudir ao primeiro grito de socorro para se defenderem das muitas hordas de índios [sic] que povoavam os sertões, e lhes ameaçavam a todo o instante as habitações [...]." (²)
O ouro era a principal preocupação dos mineradores; quase tudo o mais ficava para depois. Há que se notar, no entanto, que, apesar do desalinho das ruas, em algumas cidades coloniais que prosperaram por causa das descobertas auríferas, logo foram edificados templos magníficos (³), que até hoje impressionam pela riqueza neles investida. A religiosidade imperante nessa época de curiosas distorções (em mais de um sentido), pode muito bem explicar tal fenômeno.

(1) Para muitos, não passou de expectativa frustrada.
(2) MOUTINHO, Joaquim Ferreira. Notícia Sobre a Província de Mato Grosso. São Paulo: Typographia de Henrique Schroeder, 1869, p. 38.
(3) Para exemplo, não será preciso mais que uma caminhada de quinze minutos por Ouro Preto - MG.


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