terça-feira, 16 de abril de 2019

Quando o consumismo não é possível

Por que algumas sociedades tenderam ao consumismo e outras ficaram longe dele? Pode parecer demasiado óbvio, mas só existe consumismo quando há o que consumir, quando a produção de bens de consumo é tão farta que possibilita o exagero do ter, embora a desigualdade na distribuição também seja característica da maioria das sociedades consumistas - alguns têm muito mais que o necessário, outros menos do que precisam. 
Um consumista típico é apaixonado por shoppings centers, embora as compras on-line sejam cada vez mais frequentes e tenham já uma multidão de adeptos. No entanto, se você tiver que trabalhar duro para fazer por si mesmo os objetos de que precisa, dificilmente acalentará ideias consumistas. Pelo menos, é improvável. Isso explica, ainda que parcialmente, por que algumas sociedades se tornaram altamente consumistas, fosse pela exploração da mão de obra, mesmo que assalariada, fosse através do manejo de tecnologia voltada à produtividade (não descartando algum nível de combinação de ambas as possibilidades), enquanto outras, não dispondo de largos contingentes de trabalhadores para explorar e/ou sem tecnologia suficiente para maximizar a produção e a produtividade, tenderam apenas a produzir para consumo próprio, não chegando, em alguns casos, ao hábito da troca, a que chamamos comércio. Foi o caso de muitos povos indígenas da América.
Vejamos. Logo abaixo está uma foto de pilões (*) feitos por indígenas do Brasil. O método para produzi-los consistia em queimar a madeira no local a ser escavado e, depois, com ferramentas primitivas, dar a forma desejada. Esse processo é chamado escarificação. Até a chegada de colonizadores, era assim que povos indígenas do Brasil fabricavam canoas, potes e outros objetos de madeira, apenas para uso da própria comunidade, e não para troca. O corte de árvores era em extremo trabalhoso e o emprego de ferramentas de pedra tornava todo o processo muito lento. Não é preciso um exagero de imaginação para entender o motivo que impedia o consumismo de imperar nessas culturas.


Ora, leitores, não vai aqui nenhum juízo de valor em relação às sociedades e indivíduos consumistas. Sendo este um blog dedicado à História, a ideia é apenas mostrar que, no caso dos povos indígenas, o processo de colonização, incluindo o estímulo ao escambo, introduziu mudanças nada desprezíveis no modo como os ameríndios entendiam a produção e, por consequência, em seus conceitos relativos à propriedade individual e coletiva.

(*) Os pilões vistos na foto pertencem ao acervo do Memorial dos Povos Indígenas (Brasília - DF).

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