É menos comum hoje em dia, mas, no passado, quando um pai, por qualquer razão, ficava furioso com um filho, logo ameaçava deserdá-lo, ameaça tanto mais eficaz quanto maior fosse o patrimônio envolvido. Sob o espectro do direito romano, já houve muita legislação que facultava ao pater familias fazer, nessa questão, o que bem entendesse.
Não era assim na antiga Mesopotâmia. O Código de Hamurabi, tão radical em suas punições para crimes insignificantes (¹), parece ter até certa ternura em relação aos filhos, protegendo-os dos excessos de pais autoritários. Vejam, leitores, o que estava prescrito aos que viviam por volta de 1750 a.C.:
"Se um homem expulsa seu filho de casa, deserdando-o, e afirma ao juiz: "Eu quero deserdar meu filho", o juiz deverá analisar as razões apresentadas, e se o filho não houver cometido alguma falta grave, o pai não poderá expulsá-lo."
Observem, portanto, que competia ao juiz, e não ao pai, determinar se havia motivo suficiente para que um filho fosse excluído do direito de herança. Que adolescente da época, cheio de ideias próprias, não iria amar o legislador babilônio (²) que decidiu impor limite à despótica vontade paterna? A lei, contudo, ia além:
"Mas, se o filho houver cometido algum erro grave, pelo qual poderia ser privado do direito de herança, o pai deverá perdoá-lo uma vez; se, porém, vier a cometer erro grave novamente, seu pai poderá expulsá-lo."
Infelizmente o legislador não fez qualquer declaração quanto ao que seria uma falta bastante grave para justificar a expulsão de um filho. É notável, porém, a insistência na conciliação familiar, com a mediação de um magistrado local e a obrigação paterna de perdoar o fedelho infrator ao menos uma vez. Nada mau (se é que não se pode dizer contraditório), para um Código no qual imperava, soberana, a lei de talião.
(1) Ao menos sob o nosso ponto de vista.
(2) O Código de Hamurabi é, provavelmente, uma compilação de leis vigentes na Mesopotâmia no Século XVIII a.C., e não obra exclusiva de um único legislador.
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