quinta-feira, 5 de maio de 2022

Poetas gregos viviam na corte de governantes da Antiguidade

Anacreonte (²) 
A poesia, enquanto arte, tem e sempre teve muitos apreciadores, embora não se possa afirmar, com idêntica certeza, que sempre andou na moda. Entre os antigos gregos, era muito valorizada. Havia até competições públicas para poetas, os textos em verso eram ouvidos nos anfiteatros e quem escrevia poemas com maestria era tão importante quanto um atleta consagrado nos jogos olímpicos.
Apesar disso, uma questão se impunha naquele tempo: de que viveriam os poetas? Por suposto, não havia editoras, e a circulação de obras escritas não se fazia do mesmo modo que hoje. Na Descrição da Grécia, de Pausânias, autor grego do Século II, somos informados de que muitos poetas achavam acolhida na corte dos governantes. Teria sido o caso, por exemplo, de Anacreonte (¹), patrocinado por Polícrates, tirano de Samos, enquanto Ésquilo (³), nascido em Elêusis, viveu durante algum tempo em Siracusa (⁴). 
Mas... Mas havia, ao que parece, quem preferisse fugir à conveniência do apoio de um mandatário, para preservar a independência ou para evitar viagens.
Homero (⁸)
Esse teria sido o caso, ainda de acordo com Pausânias, de Hesíodo (⁵), autor, entre outras obras, da famosa Teogonia, e de Homero (⁶), a quem são atribuídas a Ilíada e a Odisseia. Sim, são atribuídas, porque desde a Antiguidade houve quem questionasse essa autoria. Os dois poemas, compostos e repetidos oralmente, teriam sido fruto do trabalho de muitos autores, todos anônimos. Sêneca, em
De brevitate vitae, afirmou que "[...] os gregos tinham a mania de questionar quantos remadores tinha Ulisses, se foi escrita primeiro a Ilíada ou a Odisseia e se os livros foram obra de um único autor [...]" (⁷).
Como explicar, porém, a coerência interna que perpassa praticamente toda a Ilíada? Letras não se juntam por conta própria, formando palavras ordenadamente, para compor, ainda por si mesmas, uma obra dessa extensão (aliás, de extensão nenhuma). Alguém tem de ter criado o cerne desse épico, embora não seja absurdo admitir acréscimos e supressões no poema original, fruto da repetição oral e escrita ao longo dos séculos. Seja como for, sabendo tão pouco como se sabe sobre o Hesíodo e o Homero "de verdade", como argumentar que o primeiro detestava viajar, enquanto o segundo preferia o apoio popular e a independência, e, por isso, dispensaram a subvenção de algum monarca de seu tempo? Em casos assim, na ausência de um documento confiável, o melhor que se pode dizer é que não sabemos. Conjecturas são aceitáveis, desde que não percam o caráter de possibilidades que merecem ser investigadas, devido ao desconhecimento de fatos solidamente embasados.

(1) c. 570 a.C. - 495 a.C.
(2) HEKLER, Anton. Die Bildniskunst der Griechen und Römer. Stuttgart: Julius Hoffmann, 1912, p. 6.
(3) c. 525 a.C. - 456 a.C.
(4) Cf. PAUSÂNIAS. Descrição da Grécia, Livro I.
(5) É geralmente aceito que teria vivido entre os Séculos VIII e VII a.C.
(6) Teria vivido, talvez, entre os Séculos X e IX a.C., embora haja quem suponha ter sido muito antes. 
(7) SÊNECA. De brevitate vitae. O trecho citado foi traduzido por Marta Iansen, para uso exclusivamente no blog História & Outras Histórias
(8) HEKLER, Anton. Op. cit., p. 8.


Veja também:

2 comentários:

  1. Com raras e honrosas excepções, ainda hoje a maioria dos artistas sobrevive à custa dos mecenas. A liberdade criativa acaba por se ressentir, pois é claro.

    Uma boa semana, Marta :)

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Verdade inquestionável (infelizmente).
      Um abraço, tenha uma ótima semana!

      Excluir

Democraticamente, comentários e debates construtivos serão bem-recebidos. Participe!
Devido à natureza dos assuntos tratados neste blog, todos os comentários passarão, necessariamente, por moderação, antes que sejam publicados. Comentários de caráter preconceituoso, racista, sexista, etc. não serão aceitos. Entretanto, a discussão inteligente de ideias será sempre estimulada.